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BBC News 2021 (Brasil), O que foi e como acabou a Primavera Árabe | 21 notícias que marcaram o século 21 (1)

O que foi e como acabou a Primavera Árabe | 21 notícias que marcaram o século 21 (1)

Tudo começou com um vendedor de frutas no interior da Tunísia

Mohamed Bouazizi, de 26 anos, era um ambulante na pequena cidade de Sidi Bouzid

Constantemente abordado por policiais por não ter autorização para trabalhar ou por

supostos problemas com seus produtos, era intimidado por pedidos de propina

No dia dezessete de dezembro de dois mil e dez, em novo episódio de intimidação, policiais

confiscaram seu carrinho de frutas

Bouazizi foi à sede do governo local para reclamar

e recuperar seus pertences, mas não foi recebido

Sem poder trabalhar, Bouazizi se desesperou

Comprou um galão de combustível, jogou o líquido sobre o corpo e, diante do prédio

do governo, ateou fogo

A notícia se espalhou pelo mundo, compartilhada nas mídias sociais

Rapidamente, um ato que parecia isolado se transformou em protestos generalizados contra

o desemprego e a corrupção na Tunísia

Mas não só lá

O movimento alcançaria outros países e ficaria marcado na história como Primavera Árabe

Meu nome é Camilla Veras Mota, e este é um capítulo da série da BBC News Brasil,

21 notícias do século 21

A Tunísia, país árabe no norte da África, era governado havia vinte e três anos pelo

presidente Zine al-Abidine Ben Ali, reeleito pela última vez em dois mil e nove

Apesar de proibidos pelo governo, os protestos de rua inspirados pelo vendedor de frutas

se multiplicaram e desembocaram em choques com a polícia

A comunidade internacional voltou seu olhar para a Tunísia

Pressionado, Ben Ali chegou a visitar Mohamed Bouazizi no hospital

Mas o vendedor de frutas morreu em 4 de janeiro de dois mil e onze

Enquanto a tensão no país aumentava, Ben Ali tentava manter a ordem, dizendo que os

protestos eram inaceitáveis e organizados por uma minoria de extremistas

A velocidade dos acontecimentos surpreendeu

Em janeiro de dois mil e onze, cinquenta civis tinham morrido, embora o governo da Tunísia

afirmasse que eram vinte e um

Ben Ali anunciou que não disputaria a reeleição em dois mil e catorze

Mas a promessa não diminuiu a ira dos cidadãos nas ruas

Vinte e quatro horas depois – e menos de um mês desde a imolação pública do ambulante

Mohamed Bouazizi –, o antes todo-poderoso presidente da Tunísia abandonou o país em

direção à Arábia Saudita, para nunca mais voltar

Ele morreu no exílio em dois mil e dezenove

Ben Ali deixou como herança não apenas um país em crise, com um governo interino e

sob estado de emergência

Ficou claro que era possível derrubar um ditador árabe com protestos pacíficos

A maior parte das nações árabes, inclusive as que se beneficiaram por décadas dos altos

lucros do petróleo, sofria dos mesmo males que levaram à queda de Ben Ali

A crise financeira global de 2008 tinha agravado a situação econômica na região

O desemprego subiu, especialmente entre os jovens

Como a Tunísia, outros países também eram governados por autocratas, que historicamente

reprimiam dissidências e protestos com extrema violência

Empobrecidos e com pouca esperança no futuro, cidadãos da região viram na revolta tunisiana

um exemplo a ser seguido

Sem falar no novo Iraque que, mesmo após uma ocupação devastadora, também dava a

impressão de que era possível adotar um regime mais democrático, baseado em consultas

populares

O país onde essas possibilidades de liberdade chegaram mais rápido foi o Egito

Maior nação árabe, o Egito tem cerca de noventa milhões de habitantes

O então presidente, Hosni Mubarak, estava no cargo desde outubro de 1981

O antecessor de Mubarak tinha sido o ganhador do prêmio Nobel da Paz Anwar El Sadat, de

quem Mubarak era vice

El Sadat foi assassinado a tiros num impressionante ataque de militantes islâmicos durante um

desfile militar no Cairo

No atentado, outras dez pessoas foram mortas, e o próprio Mubarak foi ferido

Em janeiro de 2011, enquanto Ben Ali renunciava ao poder na Tunísia, ativistas pela democracia

no Egito começaram a convocar protestos no país

E repetiram o modelo visto na Tunísia, aproveitando o potencial da comunicação rápida das redes

sociais

Especialmente na capital, Cairo, ruas e praças foram rapidamente tomadas pela população,

que pedia melhorias econômicas e reformas políticas

A praça Tahrir, que em português quer dizer libertação,

virou o centro do movimento por democracia

Mas a resposta do governo Mubarak também repetiu a do governo da Tunísia

Centenas de pessoas morreram em confrontos entre manifestantes, forças de segurança

e simpatizantes do regime

Cercada por tanques do Exército, a praça Tahrir se tornou uma pequena cidade-protesto,

com acampamento, comércio, coleta de lixo e um mural em memória dos mortos

Apesar da violência mais acentuada, o roteiro final acabou sendo quase uma cópia do vivido

pela Tunísia: o governo Mubarak inicialmente reagiu com violência, mas perdeu o controle

do país menos de um mês depois

Em 12 de fevereiro, após 29 anos com plenos poderes sobre o Egito, Hosni Mubarak

renunciou ao cargo

A queda de Mubarak foi cercada de entusiasmo pela população, que apostava num futuro

democrático para o país

As primeiras eleições livres da história egípcia ocorreram em 2012

Mohamed Morsi, líder do partido Liberdade e Justiça, ligado ao movimento islamista

Irmandade Muçulmana, foi o primeiro presidente do Egito eleito democraticamente

Mas após um ano, manifestantes voltaram às ruas para protestar contra o que consideravam

medidas antidemocráticas de Morsi, que estaria perseguindo grupos seculares e iniciando uma

islamização do Egito por meio de uma nova Constituição

Os protestos pediram a saída do presidente

O Exército se meteu, e um golpe de estado colocou Morsi e centenas de apoiadores na

prisão e baniu a Irmandade Muçulmana

A Constituição foi suspensa, e o general Abdel Fattah el-Sisi assumiu o poder

Em 2014, Sisi foi eleito presidente, em eleições sem a participação de partidos

islamistas

Com a segurança interna como prioridade, o governo Sisi passou a ser acusado de abusos

contra direitos humanos, especialmente prisões arbitrárias, lembrando características do

regime de Hosni Mubarak

Agora, um pouco mais de contexto: As condições econômicas que desembocaram

no levante popular que derrubou Mubarak em 2011

já eram conhecidas pela comunidade internacional

Desde os anos 1990, o Fundo Monetário Internacional impunha reformas liberalizantes ao país

Em primeiro de fevereiro, o jornal americano The Wall Street Journal citava o então diretor-gerente

do FMI, Dominique Strauss-Khan

Strauss-Khan era incisivo: os altos níveis de desemprego

entre jovens no Egito são uma bomba-relógio

O The Wall Street Journal citava os níveis de desemprego entre jovens entre os países

árabes

Egito e Tunísia tinham os mais altos níveis

A situação, segundo o jornal americano, era complicada também na Jordânia, no Marrocos

e na Síria

Alguns autocratas do Mundo Árabe então perceberam que, se usassem com violência contra protestos,

poderiam ter o mesmo destino de Ben Ali e Mubarak

Jordânia e Marrocos tentaram se antecipar logo que chegaram as notícias de Tunísia e Egito

Em fevereiro de 2011, a entidade de defesa de direitos humanos Human Rights Watch

noticiou que uma jornada de protestos em várias cidades

do Marrocos havia ocorrido de forma pacífica

Segundo a organização, as forças de segurança marroquinas até chegaram a utilizar de violência

contra manifestantes, mas aparentemente o regime do rei Mohammed Sexto mudou de estratégia

Cerca de duas semanas depois, em 9 de março, o rei Mohammed Sexto anunciou em comunicado

na televisão um plano de reforma constitucional

A proposta daria mais poderes ao primeiro-ministro e ao Parlamento, mais autonomia a regiões

do país, garantiria igualdade de direitos às mulheres e resultaria em mais liberdade

de expressão aos cidadãos

Apesar de criticada por integrantes do movimento que liderou os protestos de fevereiro, a reforma

marroquina foi aprovada quatro meses depois, em julho, em um plebiscito nacional

Segundo números do governo, setenta e três por cento dos eleitores haviam participado

da votação, com as mudanças aprovadas por noventa e oito e meio por cento dos votantes

Com a nova Constituição, o rei passaria a escolher o primeiro-ministro entre os representantes

do partido com a maior bancada no Parlamento

As eleições parlamentares foram antecipadas para o fim de 2011

Um novo Executivo, liderado pelo premiê Abdelilah Benkirane, assumiu em novembro daquele ano

Embora existissem muitas semelhanças entre os movimentos, havia também diferenças no

comportamento de manifestantes e na reação das autoridades de acordo com o grau de liberdades

democráticas de cada país durante a Primavera Árabe

Além disso, em monarquias cujos reis desfrutavam de significativa credibilidade, a insatisfação

das ruas mirava mais nos políticos que chefiavam o Executivo

Foi o que aconteceu na Jordânia

Inspirados pelos tunisianos, já no início de 2011, os jordanianos foram às

ruas em protesto contra desemprego, pobreza e corrupção

Pediam a renúncia do primeiro-ministro Samir al-Rifai, o que ocorreu poucos dias depois

Em fevereiro, o rei Abdullah colocou no cargo Marouf Bakhit e pediu que ele iniciasse imediatamente

um processo de reforma política

Bakhit não foi capaz de estabilizar a situação

Um mês depois, manifestantes já pediam sua renúncia

Em novembro, o rei Abdullah decidiu substituí-lo por Awn Khasawneh, que também não duraria

muito tempo no cargo - apenas seis meses

Apesar das constantes crises políticas, acompanhadas de protestos relativamente pacíficos, o regime

monárquico da Jordânia evitou uma revolta maior

O rei Abdullah ofereceu concessões, implantou algumas reformas internas e sobreviveu à

fase mais difícil da Primavera Árabe

As monarquias de Arábia Saudita e Kuwait enfrentaram protestos de rua de menores consequências

No Kuwait, as manifestações começaram em fevereiro e reuniram principalmente árabes

que viviam ou mesmo nasceram no país, mas não eram considerados cidadãos kuwaitianos

Em seguida, outros passaram a exigir melhorias no país, especialmente no combate à corrupção

Em novembro de dois mil e onze, manifestantes invadiram o Parlamento do Kuwait

A ação levaria à prisão, sete anos mais tarde, várias pessoas, incluindo três parlamentares

Já o regime saudita, diante de manifestações por reformas políticas, focou no dinheiro

Entre fevereiro e março de dois mil e onze, a Arábia Saudita anunciou cerca de 130 bilhões

de dólares para desempregados e para quem tentava adquirir o primeiro imóvel, além

da criação de milhares de empregos

O governo, entretanto, continuava reprimindo manifestações de rua, a maioria no leste

do país, em áreas de população xiita

O regime saudita, no entanto, não se preocupava apenas com a própria estabilidade

O minúsculo mas importante Bahrein - um arquipélago rico em petróleo na costa da Arábia Saudita

– era a bola da vez

De novo, em fevereiro de dois mil e onze, uma série de protestos abalou o pequeno país,

onde sessenta por cento dos habitantes são xiitas, governados por uma monarquia sunita,

assim como os outros reinos do Golfo

As manifestações reuniram principalmente xiitas

A Rotatória Pérola, na capital, Manama, acabou ocupada por milhares de pessoas, que

instalaram um acampamento, reproduzindo a estrutura montada por egípcios na praça

Tahir, no Egito

Em março, porém, o rei do Bahrein, Hamad bin Isa Al Khalifa, autorizou uma intervenção

militar liderada pela Arábia Saudita, com apoio dos Emirados Árabes, para sufocar a

nascente revolução

Dois mil soldados e policiais não apenas expulsaram os manifestantes, numa ação que

deixou dezenas de mortos, mas também destruíram a Rotatória Pérola e o monumento que dava

nome ao local

Mas, para dois países, a Primavera Árabe provocou mudanças profundas, ainda mais trágicas

e de longa duração

Governada por mais de quarenta anos pela mão-de-ferro do coronel Muammar Khadafi, a Líbia é dona

das maiores reservas de petróleo e gás da África

O país sempre foi marcado por diferenças históricas entre o leste, onde estão as

principais reservas de petróleo, e o oeste, onde fica a capital, Trípoli

Em fevereiro de 2011, o impacto das revoluções na Tunísia e no Egito levou a protestos de

rua, iniciados em Benghazi, segunda maior cidade do país, no leste

A resposta do regime de Khadafi veio na forma de uma repressão violenta

Os protestos espalharam-se para outras cidades, e Benghazi tornou-se o centro de um movimento

contra o regime de Khadafi

O governo enviou tropas para a cidade com a promessa de destruir a revolução que se

formava no leste da Líbia

Pouco antes de uma invasão, porém, o Conselho de Segurança das Organização das Nações


O que foi e como acabou a Primavera Árabe | 21 notícias que marcaram o século 21 (1) What the Arab Spring was and how it ended | 21 news stories that marked the 21st century (1)

Tudo começou com um vendedor de frutas no interior da Tunísia

Mohamed Bouazizi, de 26 anos, era um ambulante na pequena cidade de Sidi Bouzid

Constantemente abordado por policiais por não ter autorização para trabalhar ou por

supostos problemas com seus produtos, era intimidado por pedidos de propina

No dia dezessete de dezembro de dois mil e dez, em novo episódio de intimidação, policiais

confiscaram seu carrinho de frutas

Bouazizi foi à sede do governo local para reclamar

e recuperar seus pertences, mas não foi recebido

Sem poder trabalhar, Bouazizi se desesperou

Comprou um galão de combustível, jogou o líquido sobre o corpo e, diante do prédio

do governo, ateou fogo

A notícia se espalhou pelo mundo, compartilhada nas mídias sociais

Rapidamente, um ato que parecia isolado se transformou em protestos generalizados contra

o desemprego e a corrupção na Tunísia

Mas não só lá

O movimento alcançaria outros países e ficaria marcado na história como Primavera Árabe

Meu nome é Camilla Veras Mota, e este é um capítulo da série da BBC News Brasil,

21 notícias do século 21

A Tunísia, país árabe no norte da África, era governado havia vinte e três anos pelo

presidente Zine al-Abidine Ben Ali, reeleito pela última vez em dois mil e nove

Apesar de proibidos pelo governo, os protestos de rua inspirados pelo vendedor de frutas

se multiplicaram e desembocaram em choques com a polícia

A comunidade internacional voltou seu olhar para a Tunísia

Pressionado, Ben Ali chegou a visitar Mohamed Bouazizi no hospital

Mas o vendedor de frutas morreu em 4 de janeiro de dois mil e onze

Enquanto a tensão no país aumentava, Ben Ali tentava manter a ordem, dizendo que os

protestos eram inaceitáveis e organizados por uma minoria de extremistas

A velocidade dos acontecimentos surpreendeu

Em janeiro de dois mil e onze, cinquenta civis tinham morrido, embora o governo da Tunísia

afirmasse que eram vinte e um

Ben Ali anunciou que não disputaria a reeleição em dois mil e catorze

Mas a promessa não diminuiu a ira dos cidadãos nas ruas

Vinte e quatro horas depois – e menos de um mês desde a imolação pública do ambulante

Mohamed Bouazizi –, o antes todo-poderoso presidente da Tunísia abandonou o país em

direção à Arábia Saudita, para nunca mais voltar

Ele morreu no exílio em dois mil e dezenove

Ben Ali deixou como herança não apenas um país em crise, com um governo interino e

sob estado de emergência

Ficou claro que era possível derrubar um ditador árabe com protestos pacíficos

A maior parte das nações árabes, inclusive as que se beneficiaram por décadas dos altos

lucros do petróleo, sofria dos mesmo males que levaram à queda de Ben Ali

A crise financeira global de 2008 tinha agravado a situação econômica na região

O desemprego subiu, especialmente entre os jovens

Como a Tunísia, outros países também eram governados por autocratas, que historicamente

reprimiam dissidências e protestos com extrema violência

Empobrecidos e com pouca esperança no futuro, cidadãos da região viram na revolta tunisiana

um exemplo a ser seguido

Sem falar no novo Iraque que, mesmo após uma ocupação devastadora, também dava a

impressão de que era possível adotar um regime mais democrático, baseado em consultas

populares

O país onde essas possibilidades de liberdade chegaram mais rápido foi o Egito

Maior nação árabe, o Egito tem cerca de noventa milhões de habitantes

O então presidente, Hosni Mubarak, estava no cargo desde outubro de 1981

O antecessor de Mubarak tinha sido o ganhador do prêmio Nobel da Paz Anwar El Sadat, de

quem Mubarak era vice

El Sadat foi assassinado a tiros num impressionante ataque de militantes islâmicos durante um

desfile militar no Cairo

No atentado, outras dez pessoas foram mortas, e o próprio Mubarak foi ferido

Em janeiro de 2011, enquanto Ben Ali renunciava ao poder na Tunísia, ativistas pela democracia

no Egito começaram a convocar protestos no país

E repetiram o modelo visto na Tunísia, aproveitando o potencial da comunicação rápida das redes

sociais

Especialmente na capital, Cairo, ruas e praças foram rapidamente tomadas pela população,

que pedia melhorias econômicas e reformas políticas

A praça Tahrir, que em português quer dizer libertação,

virou o centro do movimento por democracia

Mas a resposta do governo Mubarak também repetiu a do governo da Tunísia

Centenas de pessoas morreram em confrontos entre manifestantes, forças de segurança

e simpatizantes do regime

Cercada por tanques do Exército, a praça Tahrir se tornou uma pequena cidade-protesto,

com acampamento, comércio, coleta de lixo e um mural em memória dos mortos

Apesar da violência mais acentuada, o roteiro final acabou sendo quase uma cópia do vivido

pela Tunísia: o governo Mubarak inicialmente reagiu com violência, mas perdeu o controle

do país menos de um mês depois

Em 12 de fevereiro, após 29 anos com plenos poderes sobre o Egito, Hosni Mubarak

renunciou ao cargo

A queda de Mubarak foi cercada de entusiasmo pela população, que apostava num futuro

democrático para o país

As primeiras eleições livres da história egípcia ocorreram em 2012

Mohamed Morsi, líder do partido Liberdade e Justiça, ligado ao movimento islamista

Irmandade Muçulmana, foi o primeiro presidente do Egito eleito democraticamente

Mas após um ano, manifestantes voltaram às ruas para protestar contra o que consideravam

medidas antidemocráticas de Morsi, que estaria perseguindo grupos seculares e iniciando uma

islamização do Egito por meio de uma nova Constituição

Os protestos pediram a saída do presidente

O Exército se meteu, e um golpe de estado colocou Morsi e centenas de apoiadores na

prisão e baniu a Irmandade Muçulmana

A Constituição foi suspensa, e o general Abdel Fattah el-Sisi assumiu o poder

Em 2014, Sisi foi eleito presidente, em eleições sem a participação de partidos

islamistas

Com a segurança interna como prioridade, o governo Sisi passou a ser acusado de abusos

contra direitos humanos, especialmente prisões arbitrárias, lembrando características do

regime de Hosni Mubarak

Agora, um pouco mais de contexto: As condições econômicas que desembocaram

no levante popular que derrubou Mubarak em 2011

já eram conhecidas pela comunidade internacional

Desde os anos 1990, o Fundo Monetário Internacional impunha reformas liberalizantes ao país

Em primeiro de fevereiro, o jornal americano The Wall Street Journal citava o então diretor-gerente

do FMI, Dominique Strauss-Khan

Strauss-Khan era incisivo: os altos níveis de desemprego

entre jovens no Egito são uma bomba-relógio

O The Wall Street Journal citava os níveis de desemprego entre jovens entre os países

árabes

Egito e Tunísia tinham os mais altos níveis

A situação, segundo o jornal americano, era complicada também na Jordânia, no Marrocos

e na Síria

Alguns autocratas do Mundo Árabe então perceberam que, se usassem com violência contra protestos,

poderiam ter o mesmo destino de Ben Ali e Mubarak

Jordânia e Marrocos tentaram se antecipar logo que chegaram as notícias de Tunísia e Egito

Em fevereiro de 2011, a entidade de defesa de direitos humanos Human Rights Watch

noticiou que uma jornada de protestos em várias cidades

do Marrocos havia ocorrido de forma pacífica

Segundo a organização, as forças de segurança marroquinas até chegaram a utilizar de violência

contra manifestantes, mas aparentemente o regime do rei Mohammed Sexto mudou de estratégia

Cerca de duas semanas depois, em 9 de março, o rei Mohammed Sexto anunciou em comunicado

na televisão um plano de reforma constitucional

A proposta daria mais poderes ao primeiro-ministro e ao Parlamento, mais autonomia a regiões

do país, garantiria igualdade de direitos às mulheres e resultaria em mais liberdade

de expressão aos cidadãos

Apesar de criticada por integrantes do movimento que liderou os protestos de fevereiro, a reforma

marroquina foi aprovada quatro meses depois, em julho, em um plebiscito nacional

Segundo números do governo, setenta e três por cento dos eleitores haviam participado

da votação, com as mudanças aprovadas por noventa e oito e meio por cento dos votantes

Com a nova Constituição, o rei passaria a escolher o primeiro-ministro entre os representantes

do partido com a maior bancada no Parlamento

As eleições parlamentares foram antecipadas para o fim de 2011

Um novo Executivo, liderado pelo premiê Abdelilah Benkirane, assumiu em novembro daquele ano

Embora existissem muitas semelhanças entre os movimentos, havia também diferenças no

comportamento de manifestantes e na reação das autoridades de acordo com o grau de liberdades

democráticas de cada país durante a Primavera Árabe

Além disso, em monarquias cujos reis desfrutavam de significativa credibilidade, a insatisfação

das ruas mirava mais nos políticos que chefiavam o Executivo

Foi o que aconteceu na Jordânia

Inspirados pelos tunisianos, já no início de 2011, os jordanianos foram às

ruas em protesto contra desemprego, pobreza e corrupção

Pediam a renúncia do primeiro-ministro Samir al-Rifai, o que ocorreu poucos dias depois

Em fevereiro, o rei Abdullah colocou no cargo Marouf Bakhit e pediu que ele iniciasse imediatamente

um processo de reforma política

Bakhit não foi capaz de estabilizar a situação

Um mês depois, manifestantes já pediam sua renúncia

Em novembro, o rei Abdullah decidiu substituí-lo por Awn Khasawneh, que também não duraria

muito tempo no cargo - apenas seis meses

Apesar das constantes crises políticas, acompanhadas de protestos relativamente pacíficos, o regime

monárquico da Jordânia evitou uma revolta maior

O rei Abdullah ofereceu concessões, implantou algumas reformas internas e sobreviveu à

fase mais difícil da Primavera Árabe

As monarquias de Arábia Saudita e Kuwait enfrentaram protestos de rua de menores consequências

No Kuwait, as manifestações começaram em fevereiro e reuniram principalmente árabes

que viviam ou mesmo nasceram no país, mas não eram considerados cidadãos kuwaitianos

Em seguida, outros passaram a exigir melhorias no país, especialmente no combate à corrupção

Em novembro de dois mil e onze, manifestantes invadiram o Parlamento do Kuwait

A ação levaria à prisão, sete anos mais tarde, várias pessoas, incluindo três parlamentares

Já o regime saudita, diante de manifestações por reformas políticas, focou no dinheiro

Entre fevereiro e março de dois mil e onze, a Arábia Saudita anunciou cerca de 130 bilhões

de dólares para desempregados e para quem tentava adquirir o primeiro imóvel, além

da criação de milhares de empregos

O governo, entretanto, continuava reprimindo manifestações de rua, a maioria no leste

do país, em áreas de população xiita

O regime saudita, no entanto, não se preocupava apenas com a própria estabilidade

O minúsculo mas importante Bahrein - um arquipélago rico em petróleo na costa da Arábia Saudita

– era a bola da vez

De novo, em fevereiro de dois mil e onze, uma série de protestos abalou o pequeno país,

onde sessenta por cento dos habitantes são xiitas, governados por uma monarquia sunita,

assim como os outros reinos do Golfo

As manifestações reuniram principalmente xiitas

A Rotatória Pérola, na capital, Manama, acabou ocupada por milhares de pessoas, que

instalaram um acampamento, reproduzindo a estrutura montada por egípcios na praça

Tahir, no Egito

Em março, porém, o rei do Bahrein, Hamad bin Isa Al Khalifa, autorizou uma intervenção

militar liderada pela Arábia Saudita, com apoio dos Emirados Árabes, para sufocar a

nascente revolução

Dois mil soldados e policiais não apenas expulsaram os manifestantes, numa ação que

deixou dezenas de mortos, mas também destruíram a Rotatória Pérola e o monumento que dava

nome ao local

Mas, para dois países, a Primavera Árabe provocou mudanças profundas, ainda mais trágicas

e de longa duração

Governada por mais de quarenta anos pela mão-de-ferro do coronel Muammar Khadafi, a Líbia é dona

das maiores reservas de petróleo e gás da África

O país sempre foi marcado por diferenças históricas entre o leste, onde estão as

principais reservas de petróleo, e o oeste, onde fica a capital, Trípoli

Em fevereiro de 2011, o impacto das revoluções na Tunísia e no Egito levou a protestos de

rua, iniciados em Benghazi, segunda maior cidade do país, no leste

A resposta do regime de Khadafi veio na forma de uma repressão violenta

Os protestos espalharam-se para outras cidades, e Benghazi tornou-se o centro de um movimento

contra o regime de Khadafi

O governo enviou tropas para a cidade com a promessa de destruir a revolução que se

formava no leste da Líbia

Pouco antes de uma invasão, porém, o Conselho de Segurança das Organização das Nações