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Cinco Minutos de José de Alencar, Cinco Minutos - José de Alencar - Capítulo 7

Cinco Minutos - José de Alencar - Capítulo 7

Capítulo 7 de Cinco Minutos de José de Alencar. Esta é uma gravação LibriVox, todas as gravações LibriVox estão em domínio público. Para mais informações ou para ser um voluntário, por favor, visite librivox.org. Gravado por Vicente.

Cinco Minutos de José de Alencar. Capítulo 7

Continuei a ler : "Sim, meu amigo!... "Estava condenada a morrer; estava atacada dessa moléstia fatal e traiçoeira, cujo dedo descarnado nos toca no meio dos prazeres e dos risos, nos arrasta ao leito, e do leito ao túmulo, depois de ter escarnecido da natureza, transfigurando as suas mais belas criações em múmias animadas. "É impossível descrever‑te o que se passou então em mim; foi um desespero mudo e concentrado, mas que me prostrou em uma atonia profunda; foi uma angústia pungente e cruel. "As rosas da minha vida apenas se entreabriam e já eram bafejadas por um hálito infetado; já tinham no seio o germe de morte que devia fazê‑las murchar! "Meus sonhos de futuro, minhas tão risonhas esperanças, meu puro amor, que nem sequer ainda tinha colhido o primeiro sorriso, este horizonte, que há pouco me parecia tão brilhante, tudo isto era uma visão que ia sumir‑se, uma luz que lampejava prestes a extinguir‑se. "Foi preciso um esforço sobre‑humano para esconder de minha mãe a certeza que eu tinha sobre o meu estado e para gracejar dos seus temores, que eu chamava imaginários. "Boa mãe! Desde então só viveu para consagrar‑se exclusivamente à sua filha, para envolvê‑la com esse desvelo e essa proteção que Deus deu ao coração materno, para abrigar‑me com suas preces, sua solicitude e seus carinhos, para lutar à força de amor e de dedicação contra o destino. "Logo no dia seguinte fomos para Andaraí, onde ela alugara uma chácara, e aí, graças a seus cuidados, adquiri tanta saúde, tanta força, que me julgaria boa se não fosse a sentença fatal que pesava sobre mim. "Que tesouro de sentimento e de delicadeza que é um coração de mãe, meu amigo! Que tato delicado, que sensibilidade apurada, possui esse amor sublime! "Nos primeiros dias, quando ainda estava muito abatida e era obrigada a agasalhar‑me, se visses como ela pressentia as rajadas de um vento frio antes que ele agitasse os renovos dos cedros do jardim, como adivinhava a menor neblina antes que a primeira gota umedecesse a laje do nosso terraço! "Fazia tudo por distrair‑me; brincava comigo como uma camarada de colégio; achava prazer nas menores coisas para excitar‑me a imitá‑la; tornava‑se menina e obrigava‑me a ter caprichos. "Enfim, meu amigo, se fosse a dizer‑te tudo, escreveria um livro e esse livro deves ter lido no coração de tua mãe, porque todas as mães se parecem. "Ao cabo de um mês tinha recobrado a saúde para todos, exceto para mim, que às vezes sentia um quer que seja como uma contração, que não era dor, mas que me dizia que o mal estava ali, e dormia apenas. "Foi nesta ocasião que te encontrei no ônibus de Andaraí; quando entravas, a luz do lampião iluminou‑te o rosto e eu te reconheci. "Faze idéia que emoção sentira quando te sentaste junto de mim. "O mais tu sabes; eu te amava e era tão feliz por ter‑te ao meu lado, de apertar a tua mão, que nem me lembrava como te devia parecer ridícula uma mulher que, sem te conhecer, te permitia tanto. "Quando nos separamos, arrependi‑me do que tinha feito. "Com que direito ia eu perturbar a tua felicidade, condenar‑te a um amor infeliz e obrigar‑te a associar tua vida a uma existência triste, que talvez não te pudesse dar senão os tormentos de seu longo martírio?! "Eu te amava; mas, já que Deus não me tinha concedido a graça de ser tua companheira neste mundo, não devia ir roubar ao teu lado e no teu coração o lugar que outra mais feliz, porém menos dedicada, teria de ocupar. "Continuei a amar‑te, mas impus‑me a mim mesma o sacrifício de nunca ser amada por ti. "Vês, meu amigo, que não era egoísta e preferia a tua à minha felicidade. Tu farias o mesmo, estou certa. "Aproveitei o mistério do nosso primeiro encontro e esperei que alguns dias te fizessem esquecer essa aventura e quebrassem o único e bem frágil laço que te prendia a mim. "Deus não quis que acontecesse assim; vendo‑te só em um baile, tão triste, tão pensativo, procurando um ser invisível, uma sombra e querendo descobrir os seus vestígios em algum dos rostos que passavam diante de ti, senti um prazer imenso. "Conheci que tu me amavas; e, perdoa, fiquei orgulhosa dessa paixão ardente, que uma só palavra minha havia criado, desse poder do meu amor, que, por uma força de atração inexplicável, tinha‑te ligado à minha sombra. "Não pude resistir. "Aproximei‑me, disse‑te uma palavra sem que tivesses tempo de ver‑me; foi essa mesma palavra que resume todo o poema do nosso amor e que, depois do primeiro encontro, era, como ainda hoje, a minha prece de todas as noites. "Sempre que me ajoelho diante do meu crucifixo de marfim, depois de minha oração, ainda com os olhos na cruz e o pensamento em Deus, chamo a tua imagem para pedir‑te que não te esqueças de mim. "Quando tu te voltaste ao som da minha voz, eu tinha entrado no toilette; e pouco depois saí desse baile, onde apenas acabava de entrar, tremendo da minha imprudência, mas alegre e feliz por te ter visto ainda uma vez. "Deves agora compreender o que me fizeste sofrer no teatro quando me dirigias aquela acusação tão injusta, no momento mesmo em que a Charton cantava a ária da Traviata. "Não sei como não me traí naquele momento e não te disse tudo; o teu futuro, porém, era sagrado para mim, e eu não devia destruí‑lo para satisfação de meu amor próprio ofendido. "No dia seguinte escrevi‑te; e assim, sem me trair, pude ao menos reabilitar‑me na tua estima; doía‑me muito que, ainda mesmo não me conhecendo, tivesses sobre mim uma idéia tão injusta e tão falsa. "Aqui é preciso dizer‑te que no dia seguinte ao do nosso primeiro encontro, tínhamos voltado à cidade, e eu te via passar todos os dias diante de minha janela, quando fazias o teu passeio costumado à Glória. "Por detrás das cortinas, seguia‑te com o olhar, até que desaparecias no fim da rua, e este prazer, rápido como era, alimentava o meu amor, habituado a viver de tão pouco. "Depois da minha carta tu deixaste de passar dois dias, estava eu a partir para aqui, donde devia voltar unicamente para embarcar no paquete inglês. "Minha mãe, incansável nos seus desvelos, quer levar‑me à Europa e fazer‑me viajar pela Itália, pela Grécia, por todos os países de um clima doce. "Ela diz que é para ‑ mostrar‑me os grandes modelos de arte e cultivar o meu espírito, mas eu sei que essa viagem é a sua única esperança, que não podendo nada contra a minha enfermidade, quer ao menos disputar‑lhe a sua vítima durante mais algum tempo. "Julga que fazendo‑me viajar, sempre me dará mais alguns dias de existência, como se estes sobejos de vida valessem alguma coisa para quem já perdeu a sua mocidade e o seu futuro. "Quando ia embarcar para aqui, lembrei‑me de que talvez não te visse mais e, diante dessa derradeira provança, sucumbi. Ao menos o consolo de dizer‑te adeus!... "Era o último! "Escrevi‑te segunda vez; admirava‑me da tua demora, mas tinha uma quase certeza de que havias de vir. "Não me enganei. "Vieste, e toda a minha resolução, toda a minha coragem cedeu, porque, sombra ou mulher, conheci que me amavas como eu te amo. "O mal estava feito. "Agora, meu amigo, peço‑te por mim, pelo amor que me tens, que reflitas no que te vou dizer, mas que reflitas com calma e tranqüilidade. "Para isto parti hoje de Petrópolis, sem prevenir‑te, e coloquei entre nós o espaço de vinte e quatro horas e uma distância de muitas léguas. "Desejo que não procedas precipitadamente e que, antes de dizer‑me uma palavra, tenhas medido todo o alcance que ela deve ter sobre o teu futuro. "Sabes o meu destino, sabes que sou uma vítima, cuja hora está marcada, e que todo o meu amor, imenso, profundo, não te pode dar talvez dentro em bem pouco senão o sorriso contraído pela tosse, o olhar desvairado pela febre e carícias roubadas aos sofrimentos. "É triste; e não deves imolar assim a tua bela mocidade, que ainda te reserva tantas venturas e talvez um amor como o que eu te consagro. "Deixo‑te, pois, meu retrato, meus cabelos e minha história; guarda‑os como uma lembrança e pensa algumas vezes em mim: beija esta folha muda, onde os meus lábios deixaram‑te o adeus extremo. "Entretanto, meu amigo, se, como tu dizias ontem, a felicidade é amar e sentir‑se amado; se te achas com forças de partilhar essa curta existência, esses poucos dias que me restam a passar sobre a terra, se me queres dar esse consolo supremo, único que ainda embelezaria minha vida, vem! "Sim, vem! iremos pedir ao belo céu da Itália mais alguns dias de vida para nosso amor; iremos aonde tu quiseres, ou aonde nos levar a Providência. "Errantes pelas vastas solidões dos mares ou pelos cimos elevados das montanhas, longe do mundo, sob o olhar protetor de Deus, à sombra dos cuidados de nossa mãe, viveremos tanto um como outro, encheremos de tanta afeição os nossos dias, as nossas horas, os nossos instantes, que, por curta que seja a minha existência, teremos vivido por cada minuto séculos de amor e de felicidade. "Eu espero; mas temo. "Espero‑te como a flor desfalecida espera o raio de sol que deve aquecê‑la, a gota de orvalho que pode animá‑la, o hálito da brisa que vem bafejá‑la. Porque para mim o único céu que hoje me sorri, são teus olhos; o calor que pode me fazer viver, é o do teu seio. "Entretanto temo, temo por ti, e quase peço a Deus que te inspire e te salve de um sacrifício talvez inútil! "Adeus para sempre, ou até amanhã!" CARLOTA

Fim do capítulo 7.

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