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BBC Brasil 2020 (Áudio/Vídeo+CC), Coronavírus: o avanço silencioso da covid-19 em frigoríficos do Brasil

Coronavírus: o avanço silencioso da covid-19 em frigoríficos do Brasil

[May 25, 2020].

A contaminação de trabalhadores do setor de frigoríficos com o novo coronavírus preocupa as autoridades de saúde no Brasil e no mundo.

Aqui, a doença se espalhou em um setor com uso intensivo de mão de obra - em que parte dos trabalhadores vive em pequenos municípios e se desloca todos os dias a outras pequenas e médias cidades até as fábricas, uma característica que tem facilitado a interiorização da doença, principalmente no sul.

Sou Camilla Veras Mota, da BBC News Brasil, e nesse vídeo vou falar sobre o avanço silencioso da covid-19 nos frigoríficos brasileiros.

Pelo menos quatro fábricas no Rio Grande do Sul tiveram as atividade paralisadas, total ou parcialmente.

Até meados de maio, haviam sido detectados surtos em pelo menos 17 fábricas gaúchas.

Como o Estado concentra um grande número de frigoríficos, a Secretaria de Saúde vem acompanhando a situação e divulgando dados por meio dos boletins epidemiológicos.

De acordo com o último deles, havia 409 casos confirmados entre funcionários.

Para vocês terem uma ideia de como o aumento tem sido rápido, na semana anterior esse número não chegava a 250.

Segundo os dados oficiais, são cerca de 23 mil trabalhadores expostos - entre 65 mil funcionários de frigoríficos no Estado.

O rápido aumento de infecções preocupa as autoridades de saúde porque, como eu disse no começo, esse é um segmento intensivo em mão de obra - e sua própria estrutura operacional favorece a disseminação do novo coronavírus.

Conversei com a procuradora do trabalho Priscila Dibi Schvarcz, que coordena o Projeto de Adequação das Condições de Trabalho nos Frigoríficos, e ela comentou sobre quatro dessas características:

1) O setor é intensivo em mão de obra - são centenas e às vezes milhares de trabalhadores em algumas unidades, muitos trabalhando "ombro a ombro", muito próximos, diante das esteiras por onde passa a proteína animal que eles têm de cortar ou desossar, por exemplo.

2) Existe um problema de renovação de ar nos ambientes refrigerados, em razão das próprias normas sanitárias que regulam a qualidade do produtos.

3) Há vários pontos do espaço físico da fábrica que favorecem aglomerações, como as salas para pausas e os refeitórios.

No caso do Brasil, uma característica acaba sendo mais um fator que facilita o contágio. É o 4º ponto:

4) Parte dos trabalhadores vive em municípios diferentes daqueles em que trabalham, deslocando-se até duas horas para chegar ao serviço em veículos fretados pelas empresas.

Eles se distribuem muitas vezes entre dezenas de pequenos municípios localizados no entorno das fábricas - estas frequentemente já localizadas em cidades pequenas ou médias.

Eu falei com o presidente da Federação dos Trabalhadores na Alimentação do RS, Paulo Madeira, e ele estima que mais ou menos metade da força de trabalho do setor no Estado se encaixe nesse perfil - é um pessoal que viaja diariamente nessas condições para trabalhar.

O resultado disso, de acordo com a procuradora Priscila Schvarcz, é que muitos estão levando a doença - não intencionalmente, claro - pras suas pequenas cidades.

E ela cita o caso de Ibirapuitã, com menos de 5 mil habitantes, que contabiliza 16 diagnósticos positivos para covid-19 até o momento em que esse vídeo foi gravado e um dos maiores índices de incidência da doença no Estado: 384,2 para cada 100 mil habitantes.

Segundo a procuradora, os primeiros casos foram "importados" da unidade da JBS de Passo Fundo, a pouco mais de 50 km, onde alguns moradores da cidade trabalham.

A fábrica foi interditada pela Justiça em 24 de abril e a prefeitura da cidade manteve a interdição.

Em nota, a JBS afirmou refutar os argumentos do MPT para pedir interdição cautelar da unidade em Passo Fundo.

Diz que o número de casos entre funcionários da fábrica seria 47, e não 62 e que há mortes confirmadas entre membros da equipe.

Ainda que não exista explicação definitiva sobre o ciclo de contágio em Passo Fundo, o número de mortos no município chama atenção: eram 24 quando esse vídeo foi gravado, o mesmo registrado na capital, Porto Alegre.

Mas, como a cidade é menor - tem em torno de 200 mil habitantes -, a incidência da doença é muito maior: 157 a cada 100 mil habitantes, quase quatro vezes maior que o índice da capital.

Segundo a procuradora do MPT no Estado, além de Passo Fundo, cidades como Lajeado, Garibaldi, Encantado, Tapejara, Marau, Trindade do Sul, Carlos Barbosa e Serafina Corrêa teriam diagnósticos de covid-19 com origem em frigoríficos.

O coordenador do Centro de Operações e Emergência do Centro Estadual de Vigilância em Saúde do Estado, Marcelo Vallandro, diz que a possível interiorização da doença provocada por essa dinâmica é algo que preocupa as autoridades de saúde.

Por isso o contato frequente com prefeituras e vigilâncias municipais para monitorar a evolução dos casos em áreas consideradas mais críticas.

Ele destaca também a importância de que os trabalhadores sigam as orientações de isolamento social e as medidas de precaução no dia a dia fora do ambiente de trabalho - o que em alguns casos não vinha acontecendo.

Ou seja, os funcionários também precisam fazer sua parte.

A transmissão dentro de casa, segundo ele, tem sido algo importante.

Bom, nós falamos que a própria estrutura do setor favorece a disseminação da doença.

Aliás, recentemente surtos em frigoríficos se tornaram problemas em outros países, como nos Estados Unidos e na Alemanha.

A gigante americana Tyson Foods chegou a interromper agora em maio a produção em algumas unidades por causa da contaminação de funcionários.

A procuradora Priscila Schvarcz pontua, entretanto, que esse motivo, sozinho, não explica a situação aqui no Brasil.

Segundo ela, as empresas do setor - que não foram obrigadas pelos decretos de quarentena a suspender as atividades por prestarem serviços considerados essenciais - foram bastante resistentes em adotar as recomendações da procuradoria lá no fim de março, quando elas foram publicadas.

As recomendações, ela diz, não foram adotadas de forma ampla e consistente.

Por exemplo, a sugestão de reorganização das linhas de produção para que os trabalhadores ficassem a uma distância mínima de 1,8 metro um do outro, um rearranjo do transporte para que os funcionários não se aglomerassem na entrada e saída e para que sentassem a uma distância maior uns dos outros dentro dos veículos.

O MPT também recomendava uma vigilância ativa por parte das empresas, para tentar localizar os casos no início, isolar os funcionários afetados e aqueles que tiveram contato com eles.

A ideia, segundo a procuradora, era evitar o crescimento exponencial de casos no setor.

Segundo ela, houve muita falha nesse processo de vigilância.

A Associação Brasileira de Proteína Animal, que reúne várias empresas do setor, diz que antes mesmo do início da adoção da quarentena em vários estados de todo o país, se certificou de que seus associados adotassem as medidas preventivas necessárias para proteger e prevenir, ao máximo, o risco nas unidades de produção, e que constituiu diversos comitês temáticos para o enfrentamento da crise de covid-19, onde são definidos e constantemente atualizados protocolos para a preservação da saúde dos funcionários.

Essa reportagem também está disponível em texto.

Se quiser ler na íntegra, dá uma olhada no nosso site, o link está aí na descrição.

Eu fico por aqui.

Obrigada e até a próxima!"


Coronavírus: o avanço silencioso da covid-19 em frigoríficos do Brasil Coronavirus: the silent advance of covid-19 in slaughterhouses in Brazil

[May 25, 2020].

A contaminação de trabalhadores do setor de frigoríficos com o novo coronavírus preocupa as autoridades de saúde no Brasil e no mundo.

Aqui, a doença se espalhou em um setor com uso intensivo de mão de obra - em que parte dos trabalhadores vive em pequenos municípios e se desloca todos os dias a outras pequenas e médias cidades até as fábricas, uma característica que tem facilitado a interiorização da doença, principalmente no sul.

Sou Camilla Veras Mota, da BBC News Brasil, e nesse vídeo vou falar sobre o avanço silencioso da covid-19 nos frigoríficos brasileiros.

Pelo menos quatro fábricas no Rio Grande do Sul tiveram as atividade paralisadas, total ou parcialmente.

Até meados de maio, haviam sido detectados surtos em pelo menos 17 fábricas gaúchas.

Como o Estado concentra um grande número de frigoríficos, a Secretaria de Saúde vem acompanhando a situação e divulgando dados por meio dos boletins epidemiológicos.

De acordo com o último deles, havia 409 casos confirmados entre funcionários.

Para vocês terem uma ideia de como o aumento tem sido rápido, na semana anterior esse número não chegava a 250.

Segundo os dados oficiais, são cerca de 23 mil trabalhadores expostos - entre 65 mil funcionários de frigoríficos no Estado.

O rápido aumento de infecções preocupa as autoridades de saúde porque, como eu disse no começo, esse é um segmento intensivo em mão de obra - e sua própria estrutura operacional favorece a disseminação do novo coronavírus.

Conversei com a procuradora do trabalho Priscila Dibi Schvarcz, que coordena o Projeto de Adequação das Condições de Trabalho nos Frigoríficos, e ela comentou sobre quatro dessas características:

1) O setor é intensivo em mão de obra - são centenas e às vezes milhares de trabalhadores em algumas unidades, muitos trabalhando "ombro a ombro", muito próximos, diante das esteiras por onde passa a proteína animal que eles têm de cortar ou desossar, por exemplo.

2) Existe um problema de renovação de ar nos ambientes refrigerados, em razão das próprias normas sanitárias que regulam a qualidade do produtos.

3) Há vários pontos do espaço físico da fábrica que favorecem aglomerações, como as salas para pausas e os refeitórios.

No caso do Brasil, uma característica acaba sendo mais um fator que facilita o contágio. É o 4º ponto:

4) Parte dos trabalhadores vive em municípios diferentes daqueles em que trabalham, deslocando-se até duas horas para chegar ao serviço em veículos fretados pelas empresas.

Eles se distribuem muitas vezes entre dezenas de pequenos municípios localizados no entorno das fábricas - estas frequentemente já localizadas em cidades pequenas ou médias.

Eu falei com o presidente da Federação dos Trabalhadores na Alimentação do RS, Paulo Madeira, e ele estima que mais ou menos metade da força de trabalho do setor no Estado se encaixe nesse perfil - é um pessoal que viaja diariamente nessas condições para trabalhar.

O resultado disso, de acordo com a procuradora Priscila Schvarcz, é que muitos estão levando a doença - não intencionalmente, claro - pras suas pequenas cidades.

E ela cita o caso de Ibirapuitã, com menos de 5 mil habitantes, que contabiliza 16 diagnósticos positivos para covid-19 até o momento em que esse vídeo foi gravado e um dos maiores índices de incidência da doença no Estado: 384,2 para cada 100 mil habitantes.

Segundo a procuradora, os primeiros casos foram "importados" da unidade da JBS de Passo Fundo, a pouco mais de 50 km, onde alguns moradores da cidade trabalham.

A fábrica foi interditada pela Justiça em 24 de abril e a prefeitura da cidade manteve a interdição.

Em nota, a JBS afirmou refutar os argumentos do MPT para pedir interdição cautelar da unidade em Passo Fundo.

Diz que o número de casos entre funcionários da fábrica seria 47, e não 62 e que há mortes confirmadas entre membros da equipe.

Ainda que não exista explicação definitiva sobre o ciclo de contágio em Passo Fundo, o número de mortos no município chama atenção: eram 24 quando esse vídeo foi gravado, o mesmo registrado na capital, Porto Alegre.

Mas, como a cidade é menor - tem em torno de 200 mil habitantes -, a incidência da doença é muito maior: 157 a cada 100 mil habitantes, quase quatro vezes maior que o índice da capital.

Segundo a procuradora do MPT no Estado, além de Passo Fundo, cidades como Lajeado, Garibaldi, Encantado, Tapejara, Marau, Trindade do Sul, Carlos Barbosa e Serafina Corrêa teriam diagnósticos de covid-19 com origem em frigoríficos.

O coordenador do Centro de Operações e Emergência do Centro Estadual de Vigilância em Saúde do Estado, Marcelo Vallandro, diz que a possível interiorização da doença provocada por essa dinâmica é algo que preocupa as autoridades de saúde.

Por isso o contato frequente com prefeituras e vigilâncias municipais para monitorar a evolução dos casos em áreas consideradas mais críticas.

Ele destaca também a importância de que os trabalhadores sigam as orientações de isolamento social e as medidas de precaução no dia a dia fora do ambiente de trabalho - o que em alguns casos não vinha acontecendo.

Ou seja, os funcionários também precisam fazer sua parte.

A transmissão dentro de casa, segundo ele, tem sido algo importante.

Bom, nós falamos que a própria estrutura do setor favorece a disseminação da doença.

Aliás, recentemente surtos em frigoríficos se tornaram problemas em outros países, como nos Estados Unidos e na Alemanha.

A gigante americana Tyson Foods chegou a interromper agora em maio a produção em algumas unidades por causa da contaminação de funcionários.

A procuradora Priscila Schvarcz pontua, entretanto, que esse motivo, sozinho, não explica a situação aqui no Brasil.

Segundo ela, as empresas do setor - que não foram obrigadas pelos decretos de quarentena a suspender as atividades por prestarem serviços considerados essenciais - foram bastante resistentes em adotar as recomendações da procuradoria lá no fim de março, quando elas foram publicadas.

As recomendações, ela diz, não foram adotadas de forma ampla e consistente.

Por exemplo, a sugestão de reorganização das linhas de produção para que os trabalhadores ficassem a uma distância mínima de 1,8 metro um do outro, um rearranjo do transporte para que os funcionários não se aglomerassem na entrada e saída e para que sentassem a uma distância maior uns dos outros dentro dos veículos.

O MPT também recomendava uma vigilância ativa por parte das empresas, para tentar localizar os casos no início, isolar os funcionários afetados e aqueles que tiveram contato com eles.

A ideia, segundo a procuradora, era evitar o crescimento exponencial de casos no setor.

Segundo ela, houve muita falha nesse processo de vigilância.

A Associação Brasileira de Proteína Animal, que reúne várias empresas do setor, diz que antes mesmo do início da adoção da quarentena em vários estados de todo o país, se certificou de que seus associados adotassem as medidas preventivas necessárias para proteger e prevenir, ao máximo, o risco nas unidades de produção, e que constituiu diversos comitês temáticos para o enfrentamento da crise de covid-19, onde são definidos e constantemente atualizados protocolos para a preservação da saúde dos funcionários.

Essa reportagem também está disponível em texto.

Se quiser ler na íntegra, dá uma olhada no nosso site, o link está aí na descrição.

Eu fico por aqui.

Obrigada e até a próxima!"