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PODCAST Português (*Generated Transcript*), Temos 7 sentidos - e os 5 mais conhecidos são os menos impor

Temos 7 sentidos - e os 5 mais conhecidos são os menos impor

Olá e bem-vindo a este podcast da BBC World Service.

Por favor, deixe-nos saber o que você pensa e conte-nos sobre a gente nas redes sociais.

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BBC Lê

Temos sete sentidos e os cinco mais conhecidos são os menos importantes.

Reportagem de Alejandra Martins, da BBC News Mundo, publicada pela BBC News Brasil em 26 de fevereiro de 2023.

Lida por Thomas Papon.

Enquanto você lê esta reportagem, como está seu corpo?

Ereto ou curvado?

E seu semblante? Está relaxado?

Ou você está franzindo a testa?

A nossa postura e o nosso rosto enviam sinais importantes ao cérebro

e é uma informação a qual nosso cérebro responde, como explica a neurocientista espanhola Nazaré Castellanos,

pesquisadora do laboratório Nirakara Lab e professora da Universidade Complutense de Madrid, na Espanha.

Se faço uma cara de raiva, o cérebro interpreta que essa cara é típica de raiva e, portanto, ativa os mecanismos de raiva, diz Castellanos.

Da mesma forma, quando o corpo está em uma postura típica de tristeza, o cérebro começa a ativar mecanismos neurais típicos da tristeza, acrescenta.

Nosso cérebro interage com o resto do corpo de muito mais formas do que se pensava anteriormente.

Isso porque não temos apenas cinco sentidos, mas sim sete, afirma a cientista.

E os cinco sentidos mais conhecidos, olfato, visão, audição, tato e paladar, são os menos importantes para o cérebro, diz ela.

Nazaré Castellanos conversou com a BBC News Mundo, serviço em espanhol da BBC, sobre como a postura e as expressões faciais influenciam o cérebro,

qual é o poder de um sorriso e o que podemos fazer para aprender a ouvir os sussurros do corpo.

As respostas delas são lidas por Silvia Salleck.

Como a senhora começou a investigar a relação entre a postura e o cérebro?

Eu comecei a repensar a neurociência depois de passar 20 anos pesquisando apenas o cérebro.

Parecia estranho para mim que o comportamento humano se apoiasse apenas em um órgão, que era o que está na cabeça.

Antes disso, eu havia começado a estudar a influência de órgãos como intestino no cérebro.

Eu dizia, não pode ser igual para o cérebro se meu corpo está curvado ou se meu corpo está ereto.

Então eu comecei a investigar para ver o que a literatura científica dizia.

Eu descobri coisas que me pareceram absolutamente surpreendentes e pensei, todo mundo precisa saber disso.

A senhora poderia nos explicar então por que a postura é importante e como ela influencia o cérebro?

O importante é entender que a neurociência já reconhece que temos sete sentidos.

Na escola sempre nos ensinaram que temos cinco, olfato, visão, audição, tato e paladar,

que são os sentidos da esterocepção, ou seja, do exterior.

Isso é muito simbólico porque até agora a ciência se interessou mais por estudar a relação do ser humano com o exterior.

Agora a neurociência diz há cerca de cinco anos que isso precisa ser expandido.

Não temos apenas cinco sentidos, temos sete.

E acontece que os cinco sentidos da esterocepção, audição, etc., são os menos importantes.

O número um, o sentido mais importante, é a interocepção.

E o que significa interocepção?

É a informação que chega ao cérebro sobre o que acontece dentro do organismo,

o que está acontecendo dentro dos órgãos.

Estamos falando do coração, da respiração, do estômago, do intestino.

É o sentido número um porque de todas as coisas que acontecem, é aquela a que o cérebro vai dar mais importância.

É a prioridade para o cérebro.

E o número dois em prioridade é o sentido da propriocepção,

que é a informação que chega ao cérebro sobre como está meu corpo por fora,

a postura, os gestos e as sensações que eu tenho por todo o corpo.

Por exemplo, as sensações da barriga quando ficamos nervosos,

ou o nó na garganta, ou os olhos pesados quando estamos cansados.

A propriocepção é o segundo sentido mais importante.

E na sequência vêm os outros cinco.

E isso então significa que a interocepção e a propriocepção

são o primeiro e o segundo sentidos em ordem de prioridade para o cérebro?

Já era sabido que o cérebro precisa saber como está todo o corpo,

mas antes se pensava que era uma informação passiva.

A mudança agora é que isso é um sentido,

ou seja, um sentido é aquela informação que o cérebro recebe e a qual deve responder.

Dependendo do que está acontecendo, o cérebro tem que agir de uma forma ou de outra,

e essa é a grande mudança.

Em qual parte do cérebro nós percebemos a nossa postura ou os nossos gestos?

Em nosso cérebro existe uma área que é como uma tiara,

como aquela que você usa para colocar no cabelo.

Ela se chama córtex somatossensorial, e o meu corpo está representado ali.

Ele foi descoberto em 1952, e o que se pensava é que as áreas que são maiores em nosso corpo

possuem mais neurônios no cérebro.

Portanto, o que se pensava é que o cérebro dedicava muito mais neurônios às costas,

que são muito grandes, do que, por exemplo, ao meu dedo mindinho.

Mas descobriu-se que não, que o cérebro dá muito mais importância

a algumas partes do corpo do que a outras,

e que as partes a que o cérebro dá mais importância no corpo

são o rosto, as mãos e a curvatura do corpo.

Então, meu dedo mindinho tem cerca de 100 vezes mais neurônios dedicados a ele

do que as costas inteiras, do que a perna inteira,

porque as mãos são muito importantes para nós.

Observe que quando falamos, estamos usando nossas mãos,

estamos ativando essas áreas do cérebro.

E como os gestos faciais influenciam no cérebro?

O cérebro atribui uma importância tremenda ao que acontece no rosto.

Aqui foram observadas coisas que são muito importantes.

Por um lado, foi observado que as pessoas que franzem a testa,

isso é algo que fazemos muito com celulares que têm telas pequenas,

elas estão ativando uma área relacionada à amídala.

É uma parte do cérebro que está em zonas profundas

e que está mais envolvida na emoção.

Quando eu franzo a testa, estou ativando minha amídala,

portanto, se surgir uma situação estressante, vou ficar mais estimulado,

vou reagir mais, porque já tenho essa área preparada.

A amídala, que é como uma amêndoa, é uma área que quando acontece

uma situação de estresse, se ativa, cresce.

Então, é uma área que é melhor manter calma.

Se já estiver ativada, quando chegar a uma situação estressante,

ela vai hiperativar e isso vai gerar uma hiperreação.

Tentar relaxar essa parte, não franzindo o senho,

desativa um pouco a nossa amídala, relaxa.

Em uma palestra, a senhora mencionou um estudo fascinante com canetas

que mostra como franzir a testa ou sorrir muda a maneira como interpretamos o mundo.

A senhora poderia nos explicar esse estudo?

Além da musculatura ao redor dos olhos, a segunda parte mais importante

do rosto para o cérebro é a boca.

Não temos noção do poder que ela tem, é impressionante.

Então, o que os estudos fizeram para analisar a hipótese da retroalimentação facial

foi pegar um grupo de pessoas e colocar uma caneta na boca delas.

Primeiro, elas tinham que segurar a caneta entre os dentes.

Estavam simulando um sorriso, mas sem sorrir, o que era importante.

E mostravam para elas uma série de imagens,

e elas tinham que dizer o quanto essas imagens pareciam simpáticas.

Quando tinham a caneta na boca, simulando o sorriso,

as imagens pareciam mais simpáticas para elas.

Mas quando tinham a caneta entre os lábios, simulando uma cara de raiva,

as mesmas imagens não pareciam mais tão agradáveis.

Esse estudo é da década de 1980, mas muitos, muitos estudos foram feitos desde então.

Foi observado, por exemplo, que quando vemos pessoas sorridentes, somos mais criativos.

Nossa capacidade cognitiva aumenta.

A resposta neural diante de um rosto sorridente é muito mais forte

do que diante de um rosto que não sorri ou uma cara emburrada.

A ínsula, que é uma das áreas do cérebro mais envolvidas na identidade,

ela é ativada quando vemos alguém sorrir ou quando nós mesmos sorrimos.

Sorrir não é rir, é diferente.

Então vemos o poder que um sorriso tem sobre nós,

porque o cérebro, como já dissemos, dedica um grande número de neurônios ao rosto.

Como dissemos, a propriocepção, que é a informação que chega ao cérebro

sobre como está meu corpo, e especificamente meu rosto,

é uma informação a qual o cérebro deve reagir.

Se estou triste, se eu fico com raiva, se estou feliz,

meu rosto reflete isso, mas também vice-versa.

Se eu estou com uma cara de raiva, o cérebro interpreta.

Essa cara é característica da raiva, por isso ativa mecanismos de raiva.

Ou essa cara é típica de tranquilidade, então ativa mecanismos de tranquilidade.

Ou seja, o cérebro sempre busca o que se chama de congruência mente e corpo.

E isso é interessante, porque o que acontece se eu estiver triste ou com raiva,

estressada e começar a fazer uma cara relaxada?

A princípio, o cérebro diz, isso não bate, ela está nervosa, mas está com cara de relaxada.

Então começa a gerar algo chamado migração do estado de espírito.

O cérebro diz, tudo bem, então vou tentar combinar o estado de espírito com o rosto.

Em outras palavras, veja que recursos nós temos.

A senhora também estava falando sobre outro aspecto da propriocepção, a curvatura do corpo.

Hoje, com os celulares, muitas vezes ficamos curvados. Como isso afeta o cérebro?

O cérebro, e essa é uma descoberta de três meses atrás,

tem uma área que se dedica exclusivamente a ler a postura do corpo.

O que se observou é que existem posturas corporais que o cérebro associa a um estado emocional.

Se eu, por exemplo, mover os braços para cima e para baixo,

o cérebro não tem registro de que levantar a mão é algo emocional,

porque não costumamos fazer isso, certo?

No entanto, estar curvado é algo característico da tristeza.

Isso porque quando estamos mal, nos curvamos.

E, ultimamente, todos nós adquiríamos posturas curvadas,

porque passamos oito horas por dia na frente de um computador, entre outras coisas.

É isso que se refere um famoso estudo que a senhora menciona em suas palestras, aquele do computador?

Quando temos essa postura relaxada, isso afeta a nossa percepção emocional do mundo e também nossa memória.

É aqui que entra um famoso experimento em que um laptop foi colocado na altura dos olhos dos participantes

e uma série de palavras aparecia na sequência.

No final, o computador era fechado e se perguntava às pessoas de quantas palavras elas se lembravam.

Os pesquisadores fizeram o mesmo colocando um computador no chão,

de forma que obrigasse as pessoas a se curvarem.

E o que foi observado? Que quando o corpo estava na posição curvada para baixo,

as pessoas se lembravam de menos palavras, ou seja, perdiam a capacidade de memória

e lembravam mais de palavras negativas do que positivas.

Ou seja, assim como quando estamos tristes, que é quando não somos tão ágeis cognitivamente

e nos concentramos mais no lado negativo,

quando o corpo está em uma postura característica da tristeza,

o cérebro começa a ativar os mecanismos neurais típicos da tristeza.

Então, o que a ciência está nos dizendo?

Bem, não é que você tenha que estar assim, amassado, mas estar mais consciente do seu próprio corpo ao longo do dia

e ir corrigindo essas posturas que fomos adotando.

Eu, por exemplo, me observo muito e de vez em quando descobro que voltei a ficar curvada.

Você corrige e com o tempo vai gradualmente adquirindo menos esse hábito.

Mas se você não tem essa capacidade de observar o próprio corpo,

pode ficar horas assim e não se dar conta de que está assim.

Como então nos treinamos para ouvir mais o nosso corpo?

A senhora costuma dizer que o corpo não grita, que ele sussurra e que não sabemos escutá-lo, né?

Acredito que a primeira coisa para saber como está nosso corpo é aprender a observá-lo.

E o que os estudos nos dizem é que grande parte da população tem uma consciência corporal muito baixa.

Por exemplo, toda vez que sentimos uma emoção, a sentimos em alguma parte do corpo.

As emoções sem o corpo seriam apenas uma ideia intelectual.

Há estudos que perguntam às pessoas quando você está nervoso, onde localizaria em seu corpo essa sensação.

Grande parte não sabe responder porque nunca parou para observar o próprio corpo.

Então a primeira coisa é ao longo do dia parar para observar como está meu corpo.

E quando sentimos uma emoção, paramos por um momento e dizemos onde posso encontrá-la?

Como sinto meu corpo agora? Ou seja, fazer muito mais observação corporal.

E essa consciência corporal ajuda com as emoções difíceis?

Quando fico nervosa, por exemplo, eu sinto algo no estômago ou um nó na garganta.

Tudo isso está sendo sentido pelo meu cérebro. Ele recebe isso.

Quando eu estou consciente dessas sensações, a informação que chega ao cérebro é mais clara.

Portanto o cérebro tem uma capacidade melhor de discernir uma emoção da outra.

Ou seja, uma coisa é esse sussurro quase inconsciente e outra é transformá-lo em palavras.

E fazemos isso com a consciência, que também é uma aliada no gerenciamento das emoções.

Porque quando estamos envolvidos em uma emoção, seja ela qual for,

se pararmos naquele momento e desviarmos nossa atenção para as sensações do corpo, isso nos alivia muito.

É uma das formas de relaxar, de frear esse turbilhão em que nos metemos quando temos uma emoção.

Isso se chama consciência corporal.

Já nos anos 1990, Antônio Damasio, o grande neurocientista do nosso tempo,

falava dos benefícios desse marcador somático.

Ele fez muitos experimentos em que foi observado que as pessoas que têm uma maior consciência corporal

tomam decisões melhores.

Na minha opinião, isso acontece porque não é que o corpo te diga para onde você deve ir,

mas sim onde você está.

E se estamos em uma situação complexa e há emoções envolvidas,

e nem sequer eu sei onde estou ou que emoção estou tendo,

é mais difícil para eu saber para onde devo ir.

As emoções são muito complexas e normalmente estão misturadas.

Conseguir identificar uma emoção apenas com uma análise mental

é mais difícil do que observando meu próprio corpo.

Mas é claro que para isso precisamos nos treinar,

observar ao longo do dia as sensações do corpo,

quando estou cansada, quando estou feliz, quando estou mais neutra,

quando estou com raiva, sobrecarregada, onde eu sinto isso.

Isso nos ajuda muito a nos conhecer.

A postura curvada prejudica a nossa respiração.

A senhora poderia falar sobre essa relação entre respiração e cérebro?

A respiração é uma aliada que temos completamente em nossas mãos,

mas não sabemos respirar.

A postura e a respiração estão intimamente relacionadas.

Se você cuida da sua postura, você cuida da sua respiração.

Então, o que se observou na neuroanatomia da respiração

é que a respiração influencia na memória, na atenção

e no gerenciamento das emoções.

Mas cuidado! Isso se a respiração for nasal,

se a inspiração for pelo nariz.

Se inspirarmos pela boca, e grande parte da população respira pela boca,

não temos tanta capacidade de ativar o cérebro.

O cérebro precisa que marquem os ritmos para ele.

E a respiração é um dos marca-passos que nosso cérebro possui

para que os neurônios gerem seus ritmos,

suas descargas elétricas.

Se respiramos pela boca, é um marca-passo atenuado.

Tem que ser a respiração pelo nariz.

O momento em que mais temos memória é o momento em que estamos inspirando pelo nariz.

Nesse momento, o hipocampo está ativado.

Se te disseram algo, uma palavra, no momento em que coincidiu com a inspiração,

você tem mais chance de lembrar do que se te dissessem

quando você estava expelindo ar na expiração.

Isso nos remete a uma coisa muito interessante,

que é a respiração lenta.

Normalmente, respiramos muito rápido.

E qual a importância da respiração lenta?

Acabamos de publicar um estudo científico sobre o poder da respiração lenta

como analgésico em casos de dor crônica por discopatia,

que é a deterioração dos discos entre as vértebras.

E para as emoções, o importante é que o tempo para expirar, para tirar o ar,

seja maior do que o tempo para inspirar.

Olha só que importante, quantas coisas podemos fazer com o nosso próprio corpo.

Nosso corpo é um instrumento que faz o som da nossa vida,

mas é um instrumento que não sabemos tocar.

Temos que primeiro aprender a conhecê-lo e depois a tocá-lo.

Você ouviu a reportagem Temos 7 Sentidos.

E os cinco mais conhecidos são os menos importantes.

Publicada pela BBC News Brasil em 26 de fevereiro de 2023.


Temos 7 sentidos - e os 5 mais conhecidos são os menos impor Wir haben 7 Sinne - und die 5 bekanntesten sind die unwichtigsten We have 7 senses - and the 5 best known are the least important Tenemos 7 sentidos - y los 5 más conocidos son los menos importantes 我们有 7 种感官 - 其中 5 种最知名的感官是最不重要的 我們有 7 種感官 - 其中 5 種最知名的感官是最不重要的

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BBC Lê

Temos sete sentidos e os cinco mais conhecidos são os menos importantes.

Reportagem de Alejandra Martins, da BBC News Mundo, publicada pela BBC News Brasil em 26 de fevereiro de 2023.

Lida por Thomas Papon.

Enquanto você lê esta reportagem, como está seu corpo?

Ereto ou curvado?

E seu semblante? Está relaxado?

Ou você está franzindo a testa?

A nossa postura e o nosso rosto enviam sinais importantes ao cérebro

e é uma informação a qual nosso cérebro responde, como explica a neurocientista espanhola Nazaré Castellanos,

pesquisadora do laboratório Nirakara Lab e professora da Universidade Complutense de Madrid, na Espanha.

Se faço uma cara de raiva, o cérebro interpreta que essa cara é típica de raiva e, portanto, ativa os mecanismos de raiva, diz Castellanos.

Da mesma forma, quando o corpo está em uma postura típica de tristeza, o cérebro começa a ativar mecanismos neurais típicos da tristeza, acrescenta.

Nosso cérebro interage com o resto do corpo de muito mais formas do que se pensava anteriormente.

Isso porque não temos apenas cinco sentidos, mas sim sete, afirma a cientista.

E os cinco sentidos mais conhecidos, olfato, visão, audição, tato e paladar, são os menos importantes para o cérebro, diz ela.

Nazaré Castellanos conversou com a BBC News Mundo, serviço em espanhol da BBC, sobre como a postura e as expressões faciais influenciam o cérebro,

qual é o poder de um sorriso e o que podemos fazer para aprender a ouvir os sussurros do corpo.

As respostas delas são lidas por Silvia Salleck.

Como a senhora começou a investigar a relação entre a postura e o cérebro?

Eu comecei a repensar a neurociência depois de passar 20 anos pesquisando apenas o cérebro.

Parecia estranho para mim que o comportamento humano se apoiasse apenas em um órgão, que era o que está na cabeça.

Antes disso, eu havia começado a estudar a influência de órgãos como intestino no cérebro.

Eu dizia, não pode ser igual para o cérebro se meu corpo está curvado ou se meu corpo está ereto.

Então eu comecei a investigar para ver o que a literatura científica dizia.

Eu descobri coisas que me pareceram absolutamente surpreendentes e pensei, todo mundo precisa saber disso.

A senhora poderia nos explicar então por que a postura é importante e como ela influencia o cérebro?

O importante é entender que a neurociência já reconhece que temos sete sentidos.

Na escola sempre nos ensinaram que temos cinco, olfato, visão, audição, tato e paladar,

que são os sentidos da esterocepção, ou seja, do exterior.

Isso é muito simbólico porque até agora a ciência se interessou mais por estudar a relação do ser humano com o exterior.

Agora a neurociência diz há cerca de cinco anos que isso precisa ser expandido.

Não temos apenas cinco sentidos, temos sete.

E acontece que os cinco sentidos da esterocepção, audição, etc., são os menos importantes.

O número um, o sentido mais importante, é a interocepção.

E o que significa interocepção?

É a informação que chega ao cérebro sobre o que acontece dentro do organismo,

o que está acontecendo dentro dos órgãos.

Estamos falando do coração, da respiração, do estômago, do intestino.

É o sentido número um porque de todas as coisas que acontecem, é aquela a que o cérebro vai dar mais importância.

É a prioridade para o cérebro.

E o número dois em prioridade é o sentido da propriocepção,

que é a informação que chega ao cérebro sobre como está meu corpo por fora,

a postura, os gestos e as sensações que eu tenho por todo o corpo.

Por exemplo, as sensações da barriga quando ficamos nervosos,

ou o nó na garganta, ou os olhos pesados quando estamos cansados.

A propriocepção é o segundo sentido mais importante.

E na sequência vêm os outros cinco.

E isso então significa que a interocepção e a propriocepção

são o primeiro e o segundo sentidos em ordem de prioridade para o cérebro?

Já era sabido que o cérebro precisa saber como está todo o corpo,

mas antes se pensava que era uma informação passiva.

A mudança agora é que isso é um sentido,

ou seja, um sentido é aquela informação que o cérebro recebe e a qual deve responder.

Dependendo do que está acontecendo, o cérebro tem que agir de uma forma ou de outra,

e essa é a grande mudança.

Em qual parte do cérebro nós percebemos a nossa postura ou os nossos gestos?

Em nosso cérebro existe uma área que é como uma tiara,

como aquela que você usa para colocar no cabelo.

Ela se chama córtex somatossensorial, e o meu corpo está representado ali.

Ele foi descoberto em 1952, e o que se pensava é que as áreas que são maiores em nosso corpo

possuem mais neurônios no cérebro.

Portanto, o que se pensava é que o cérebro dedicava muito mais neurônios às costas,

que são muito grandes, do que, por exemplo, ao meu dedo mindinho.

Mas descobriu-se que não, que o cérebro dá muito mais importância

a algumas partes do corpo do que a outras,

e que as partes a que o cérebro dá mais importância no corpo

são o rosto, as mãos e a curvatura do corpo.

Então, meu dedo mindinho tem cerca de 100 vezes mais neurônios dedicados a ele

do que as costas inteiras, do que a perna inteira,

porque as mãos são muito importantes para nós.

Observe que quando falamos, estamos usando nossas mãos,

estamos ativando essas áreas do cérebro.

E como os gestos faciais influenciam no cérebro?

O cérebro atribui uma importância tremenda ao que acontece no rosto.

Aqui foram observadas coisas que são muito importantes.

Por um lado, foi observado que as pessoas que franzem a testa,

isso é algo que fazemos muito com celulares que têm telas pequenas,

elas estão ativando uma área relacionada à amídala.

É uma parte do cérebro que está em zonas profundas

e que está mais envolvida na emoção.

Quando eu franzo a testa, estou ativando minha amídala,

portanto, se surgir uma situação estressante, vou ficar mais estimulado,

vou reagir mais, porque já tenho essa área preparada.

A amídala, que é como uma amêndoa, é uma área que quando acontece

uma situação de estresse, se ativa, cresce.

Então, é uma área que é melhor manter calma.

Se já estiver ativada, quando chegar a uma situação estressante,

ela vai hiperativar e isso vai gerar uma hiperreação.

Tentar relaxar essa parte, não franzindo o senho,

desativa um pouco a nossa amídala, relaxa.

Em uma palestra, a senhora mencionou um estudo fascinante com canetas

que mostra como franzir a testa ou sorrir muda a maneira como interpretamos o mundo.

A senhora poderia nos explicar esse estudo?

Além da musculatura ao redor dos olhos, a segunda parte mais importante

do rosto para o cérebro é a boca.

Não temos noção do poder que ela tem, é impressionante.

Então, o que os estudos fizeram para analisar a hipótese da retroalimentação facial

foi pegar um grupo de pessoas e colocar uma caneta na boca delas.

Primeiro, elas tinham que segurar a caneta entre os dentes.

Estavam simulando um sorriso, mas sem sorrir, o que era importante.

E mostravam para elas uma série de imagens,

e elas tinham que dizer o quanto essas imagens pareciam simpáticas.

Quando tinham a caneta na boca, simulando o sorriso,

as imagens pareciam mais simpáticas para elas.

Mas quando tinham a caneta entre os lábios, simulando uma cara de raiva,

as mesmas imagens não pareciam mais tão agradáveis.

Esse estudo é da década de 1980, mas muitos, muitos estudos foram feitos desde então.

Foi observado, por exemplo, que quando vemos pessoas sorridentes, somos mais criativos.

Nossa capacidade cognitiva aumenta.

A resposta neural diante de um rosto sorridente é muito mais forte

do que diante de um rosto que não sorri ou uma cara emburrada.

A ínsula, que é uma das áreas do cérebro mais envolvidas na identidade,

ela é ativada quando vemos alguém sorrir ou quando nós mesmos sorrimos.

Sorrir não é rir, é diferente.

Então vemos o poder que um sorriso tem sobre nós,

porque o cérebro, como já dissemos, dedica um grande número de neurônios ao rosto.

Como dissemos, a propriocepção, que é a informação que chega ao cérebro

sobre como está meu corpo, e especificamente meu rosto,

é uma informação a qual o cérebro deve reagir.

Se estou triste, se eu fico com raiva, se estou feliz,

meu rosto reflete isso, mas também vice-versa.

Se eu estou com uma cara de raiva, o cérebro interpreta.

Essa cara é característica da raiva, por isso ativa mecanismos de raiva.

Ou essa cara é típica de tranquilidade, então ativa mecanismos de tranquilidade.

Ou seja, o cérebro sempre busca o que se chama de congruência mente e corpo.

E isso é interessante, porque o que acontece se eu estiver triste ou com raiva,

estressada e começar a fazer uma cara relaxada?

A princípio, o cérebro diz, isso não bate, ela está nervosa, mas está com cara de relaxada.

Então começa a gerar algo chamado migração do estado de espírito.

O cérebro diz, tudo bem, então vou tentar combinar o estado de espírito com o rosto.

Em outras palavras, veja que recursos nós temos.

A senhora também estava falando sobre outro aspecto da propriocepção, a curvatura do corpo.

Hoje, com os celulares, muitas vezes ficamos curvados. Como isso afeta o cérebro?

O cérebro, e essa é uma descoberta de três meses atrás,

tem uma área que se dedica exclusivamente a ler a postura do corpo.

O que se observou é que existem posturas corporais que o cérebro associa a um estado emocional.

Se eu, por exemplo, mover os braços para cima e para baixo,

o cérebro não tem registro de que levantar a mão é algo emocional,

porque não costumamos fazer isso, certo?

No entanto, estar curvado é algo característico da tristeza.

Isso porque quando estamos mal, nos curvamos.

E, ultimamente, todos nós adquiríamos posturas curvadas,

porque passamos oito horas por dia na frente de um computador, entre outras coisas.

É isso que se refere um famoso estudo que a senhora menciona em suas palestras, aquele do computador?

Quando temos essa postura relaxada, isso afeta a nossa percepção emocional do mundo e também nossa memória.

É aqui que entra um famoso experimento em que um laptop foi colocado na altura dos olhos dos participantes

e uma série de palavras aparecia na sequência.

No final, o computador era fechado e se perguntava às pessoas de quantas palavras elas se lembravam.

Os pesquisadores fizeram o mesmo colocando um computador no chão,

de forma que obrigasse as pessoas a se curvarem.

E o que foi observado? Que quando o corpo estava na posição curvada para baixo,

as pessoas se lembravam de menos palavras, ou seja, perdiam a capacidade de memória

e lembravam mais de palavras negativas do que positivas.

Ou seja, assim como quando estamos tristes, que é quando não somos tão ágeis cognitivamente

e nos concentramos mais no lado negativo,

quando o corpo está em uma postura característica da tristeza,

o cérebro começa a ativar os mecanismos neurais típicos da tristeza.

Então, o que a ciência está nos dizendo?

Bem, não é que você tenha que estar assim, amassado, mas estar mais consciente do seu próprio corpo ao longo do dia

e ir corrigindo essas posturas que fomos adotando.

Eu, por exemplo, me observo muito e de vez em quando descobro que voltei a ficar curvada.

Você corrige e com o tempo vai gradualmente adquirindo menos esse hábito.

Mas se você não tem essa capacidade de observar o próprio corpo,

pode ficar horas assim e não se dar conta de que está assim.

Como então nos treinamos para ouvir mais o nosso corpo?

A senhora costuma dizer que o corpo não grita, que ele sussurra e que não sabemos escutá-lo, né?

Acredito que a primeira coisa para saber como está nosso corpo é aprender a observá-lo.

E o que os estudos nos dizem é que grande parte da população tem uma consciência corporal muito baixa.

Por exemplo, toda vez que sentimos uma emoção, a sentimos em alguma parte do corpo.

As emoções sem o corpo seriam apenas uma ideia intelectual.

Há estudos que perguntam às pessoas quando você está nervoso, onde localizaria em seu corpo essa sensação.

Grande parte não sabe responder porque nunca parou para observar o próprio corpo.

Então a primeira coisa é ao longo do dia parar para observar como está meu corpo.

E quando sentimos uma emoção, paramos por um momento e dizemos onde posso encontrá-la?

Como sinto meu corpo agora? Ou seja, fazer muito mais observação corporal.

E essa consciência corporal ajuda com as emoções difíceis?

Quando fico nervosa, por exemplo, eu sinto algo no estômago ou um nó na garganta.

Tudo isso está sendo sentido pelo meu cérebro. Ele recebe isso.

Quando eu estou consciente dessas sensações, a informação que chega ao cérebro é mais clara.

Portanto o cérebro tem uma capacidade melhor de discernir uma emoção da outra.

Ou seja, uma coisa é esse sussurro quase inconsciente e outra é transformá-lo em palavras.

E fazemos isso com a consciência, que também é uma aliada no gerenciamento das emoções.

Porque quando estamos envolvidos em uma emoção, seja ela qual for,

se pararmos naquele momento e desviarmos nossa atenção para as sensações do corpo, isso nos alivia muito.

É uma das formas de relaxar, de frear esse turbilhão em que nos metemos quando temos uma emoção.

Isso se chama consciência corporal.

Já nos anos 1990, Antônio Damasio, o grande neurocientista do nosso tempo,

falava dos benefícios desse marcador somático.

Ele fez muitos experimentos em que foi observado que as pessoas que têm uma maior consciência corporal

tomam decisões melhores.

Na minha opinião, isso acontece porque não é que o corpo te diga para onde você deve ir,

mas sim onde você está.

E se estamos em uma situação complexa e há emoções envolvidas,

e nem sequer eu sei onde estou ou que emoção estou tendo,

é mais difícil para eu saber para onde devo ir.

As emoções são muito complexas e normalmente estão misturadas.

Conseguir identificar uma emoção apenas com uma análise mental

é mais difícil do que observando meu próprio corpo.

Mas é claro que para isso precisamos nos treinar,

observar ao longo do dia as sensações do corpo,

quando estou cansada, quando estou feliz, quando estou mais neutra,

quando estou com raiva, sobrecarregada, onde eu sinto isso.

Isso nos ajuda muito a nos conhecer.

A postura curvada prejudica a nossa respiração.

A senhora poderia falar sobre essa relação entre respiração e cérebro?

A respiração é uma aliada que temos completamente em nossas mãos,

mas não sabemos respirar.

A postura e a respiração estão intimamente relacionadas.

Se você cuida da sua postura, você cuida da sua respiração.

Então, o que se observou na neuroanatomia da respiração

é que a respiração influencia na memória, na atenção

e no gerenciamento das emoções.

Mas cuidado! Isso se a respiração for nasal,

se a inspiração for pelo nariz.

Se inspirarmos pela boca, e grande parte da população respira pela boca,

não temos tanta capacidade de ativar o cérebro.

O cérebro precisa que marquem os ritmos para ele.

E a respiração é um dos marca-passos que nosso cérebro possui

para que os neurônios gerem seus ritmos,

suas descargas elétricas.

Se respiramos pela boca, é um marca-passo atenuado.

Tem que ser a respiração pelo nariz.

O momento em que mais temos memória é o momento em que estamos inspirando pelo nariz.

Nesse momento, o hipocampo está ativado.

Se te disseram algo, uma palavra, no momento em que coincidiu com a inspiração,

você tem mais chance de lembrar do que se te dissessem

quando você estava expelindo ar na expiração.

Isso nos remete a uma coisa muito interessante,

que é a respiração lenta.

Normalmente, respiramos muito rápido.

E qual a importância da respiração lenta?

Acabamos de publicar um estudo científico sobre o poder da respiração lenta

como analgésico em casos de dor crônica por discopatia,

que é a deterioração dos discos entre as vértebras.

E para as emoções, o importante é que o tempo para expirar, para tirar o ar,

seja maior do que o tempo para inspirar.

Olha só que importante, quantas coisas podemos fazer com o nosso próprio corpo.

Nosso corpo é um instrumento que faz o som da nossa vida,

mas é um instrumento que não sabemos tocar.

Temos que primeiro aprender a conhecê-lo e depois a tocá-lo.

Você ouviu a reportagem Temos 7 Sentidos.

E os cinco mais conhecidos são os menos importantes.

Publicada pela BBC News Brasil em 26 de fevereiro de 2023.