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Gloss Brazilian Portuguese Level 3, Em um governo da bronca, o homem do diálogo

Em um governo da bronca, o homem do diálogo

Aloizio Mercadante: no governo da bronca, o homem do diálogo. Na Casa Civil, ele será o principal negociador de uma presidente que não gosta de negociar. Para ter sucesso, terá de evitar os escorregões do passado.

Leandro Loyola

Após três anos de governo, boa parte dos ministros ainda se incomoda com as broncas da presidente Dilma Rousseff. Franca e direta, Dilma costuma fazer críticas ácidas, sem preocupação com os sentimentos alheios. O ministro da Educação, Aloizio Mercadante (PT), é um dos poucos que aprenderam a contornar essa situação. Em momentos delicados, Mercadante precede a exposição de seus argumentos com algum elogio à posição defendida por Dilma. Em algumas dessas ocasiões, consegue melhorar um pouco o clima e, com jeito, até fazer com que ela ouça e aceite um ponto de vista diferente. Essa habilidade pode ser uma das explicações para o fato de Mercadante ser o único ministro promovido nos três anos de governo Dilma. Começou na Ciência e Tecnologia, passou ao Ministério da Educação e, com a saída de Gleisi Hoffmann, será o próximo ministro-chefe da Casa Civil. Na Pasta, ele terá a missão de ser o principal negociador de uma presidente que não gosta de negociar.

Mercadante deverá ser o primeiro ministro da Casa Civil, desde José Dirceu, a ter maior liberdade para atuar na articulação política – além de cuidar da missão maior da Casa Civil, a administração do governo. Na história recente, os ministros da Casa Civil eram personagens mais dedicados à árdua missão de cuidar de medidas provisórias, organizar projetos de outros ministérios e administrar problemas como cartões corporativos. A exceção foi Dirceu. No primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ele acumulou ambas as coisas. Era poder demais concentrado – resultou no mensalão. Depois dele, Dilma e Erenice Guerra eram menos atuantes na política. Em sua curta gestão, Antonio Palocci teve liberdade para discutir cargos com aliados. A discreta Gleisi Hoffmann foi mais contida.

Mercadante não terá tanto poder quanto Dirceu tinha. Deve, no entanto, cuidar da relação com aliados e oposição. Deputado e senador entre 1995 e 2010, Mercadante sabe dialogar com o Congresso – um problema crônico do governo Dilma. Sua ascensão é um perigo para a ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti. Dez entre dez parlamentares reclamam de Ideli, por achar que ela não tem autonomia para resolver suas demandas. Se ficar no governo, Ideli terá a sombra acachapante do novo ministro.

Mesmo quando comandava o Ministério da Educação, uma das áreas mais problemáticas e desafiadoras para o país, Mercadante já tratava de diversos temas políticos sensíveis ao governo, como se fosse seu articulador oficial. No ano passado, antecipou-se ao colega Alexandre Padilha, da Saúde, ao falar do programa Mais Médicos ao Congresso. O protagonismo causou desconforto a Padilha. Durante as manifestações de junho, Mercadante alertou o Congresso sobre os riscos de não dar prioridade aos cinco pactos propostos pela presidente Dilma Rousseff como solução para a crise. Disse que haveria “uma grande renovação no Congresso” se a voz das ruas não fosse ouvida. Sua postura não foi bem-vista entre os parlamentares. Esses escorregões atrapalharam um pouco a relação com Dilma, mas Mercadante se recuperou e acumulou prestígio. Ele participa das reuniões sobre eleições, realizadas regularmente no Palácio da Alvorada, quando Dilma recebe Lula, o marqueteiro João Santana, o presidente do PT, Rui Falcão, e o ex-ministro Franklin Martins.

O limite posto a Mercadante é a política econômica. Dilma não admite nenhuma intromissão no trabalho do ministro Guido Mantega. No início do governo, Mantega não gostava de tratar alguns assuntos com Dilma na presença de Palocci, então na Casa Civil e seu antecessor na Fazenda. Economista por formação, Mercadante sempre gostou de falar sobre a política econômica e acalentou o projeto de comandar a área. Na Casa Civil, não poderá cometer deslizes nesse terreno minado.

O maior perigo a ser enfrentado por Mercadante em sua futura relação com o Congresso é uma história mal resolvida do governo Lula. Em 2009, então líder do governo no Senado, Mercadante tinha uma missão espinhosa pela frente. Cabia a ele indicar dois senadores amigos para o Conselho de Ética, com a missão de bloquear três pedidos de investigação sobre o ex-presidente José Sarney (PMDB-AP) e um relacionado ao senador Renan Calheiros (PMDB-AL). Mercadante se recusou publicamente a fazer isso. Pressionado, anunciou até em uma rede social que não aceitaria a imposição e renunciaria ao cargo. Três dias depois, voltou atrás. Em um discurso no plenário do Senado, anunciou que permanecera no cargo a pedido de Lula. Sarney e Renan se livraram dos incômodos pedidos de investigação, graças à ajuda de Lula e do PMDB. Mas não esquecem a atuação de Mercadante.


Em um governo da bronca, o homem do diálogo

Aloizio Mercadante: no governo da bronca, o homem do diálogo. Na Casa Civil, ele será o principal negociador de uma presidente que não gosta de negociar. Para ter sucesso, terá de evitar os escorregões do passado.

Leandro Loyola

Após três anos de governo, boa parte dos ministros ainda se incomoda com as broncas da presidente Dilma Rousseff. Franca e direta, Dilma costuma fazer críticas ácidas, sem preocupação com os sentimentos alheios. O ministro da Educação, Aloizio Mercadante (PT), é um dos poucos que aprenderam a contornar essa situação. Em momentos delicados, Mercadante precede a exposição de seus argumentos com algum elogio à posição defendida por Dilma. Em algumas dessas ocasiões, consegue melhorar um pouco o clima e, com jeito, até fazer com que ela ouça e aceite um ponto de vista diferente. Essa habilidade pode ser uma das explicações para o fato de Mercadante ser o único ministro promovido nos três anos de governo Dilma. Começou na Ciência e Tecnologia, passou ao Ministério da Educação e, com a saída de Gleisi Hoffmann, será o próximo ministro-chefe da Casa Civil. Na Pasta, ele terá a missão de ser o principal negociador de uma presidente que não gosta de negociar.

Mercadante deverá ser o primeiro ministro da Casa Civil, desde José Dirceu, a ter maior liberdade para atuar na articulação política – além de cuidar da missão maior da Casa Civil, a administração do governo. Na história recente, os ministros da Casa Civil eram personagens mais dedicados à árdua missão de cuidar de medidas provisórias, organizar projetos de outros ministérios e administrar problemas como cartões corporativos. A exceção foi Dirceu. No primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ele acumulou ambas as coisas. Era poder demais concentrado – resultou no mensalão. Depois dele, Dilma e Erenice Guerra eram menos atuantes na política. Em sua curta gestão, Antonio Palocci teve liberdade para discutir cargos com aliados. A discreta Gleisi Hoffmann foi mais contida.

Mercadante não terá tanto poder quanto Dirceu tinha. Deve, no entanto, cuidar da relação com aliados e oposição. Deputado e senador entre 1995 e 2010, Mercadante sabe dialogar com o Congresso – um problema crônico do governo Dilma. Sua ascensão é um perigo para a ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti. Dez entre dez parlamentares reclamam de Ideli, por achar que ela não tem autonomia para resolver suas demandas. Se ficar no governo, Ideli terá a sombra acachapante do novo ministro.

Mesmo quando comandava o Ministério da Educação, uma das áreas mais problemáticas e desafiadoras para o país, Mercadante já tratava de diversos temas políticos sensíveis ao governo, como se fosse seu articulador oficial. No ano passado, antecipou-se ao colega Alexandre Padilha, da Saúde, ao falar do programa Mais Médicos ao Congresso. O protagonismo causou desconforto a Padilha. Durante as manifestações de junho, Mercadante alertou o Congresso sobre os riscos de não dar prioridade aos cinco pactos propostos pela presidente Dilma Rousseff como solução para a crise. Disse que haveria “uma grande renovação no Congresso” se a voz das ruas não fosse ouvida. Sua postura não foi bem-vista entre os parlamentares. Esses escorregões atrapalharam um pouco a relação com Dilma, mas Mercadante se recuperou e acumulou prestígio. Ele participa das reuniões sobre eleições, realizadas regularmente no Palácio da Alvorada, quando Dilma recebe Lula, o marqueteiro João Santana, o presidente do PT, Rui Falcão, e o ex-ministro Franklin Martins.

O limite posto a Mercadante é a política econômica. Dilma não admite nenhuma intromissão no trabalho do ministro Guido Mantega. No início do governo, Mantega não gostava de tratar alguns assuntos com Dilma na presença de Palocci, então na Casa Civil e seu antecessor na Fazenda. Economista por formação, Mercadante sempre gostou de falar sobre a política econômica e acalentou o projeto de comandar a área. Na Casa Civil, não poderá cometer deslizes nesse terreno minado.

O maior perigo a ser enfrentado por Mercadante em sua futura relação com o Congresso é uma história mal resolvida do governo Lula. Em 2009, então líder do governo no Senado, Mercadante tinha uma missão espinhosa pela frente. Cabia a ele indicar dois senadores amigos para o Conselho de Ética, com a missão de bloquear três pedidos de investigação sobre o ex-presidente José Sarney (PMDB-AP) e um relacionado ao senador Renan Calheiros (PMDB-AL). Mercadante se recusou publicamente a fazer isso. Pressionado, anunciou até em uma rede social que não aceitaria a imposição e renunciaria ao cargo. Três dias depois, voltou atrás. Em um discurso no plenário do Senado, anunciou que permanecera no cargo a pedido de Lula. Sarney e Renan se livraram dos incômodos pedidos de investigação, graças à ajuda de Lula e do PMDB. Mas não esquecem a atuação de Mercadante.