ESCUTA AQUI
-Alô? -Alô, Sérgio?
Sérgio, escuta aqui.
Eu só estou te ligando pra que você saiba...
que, mesmo quando o amor acaba, o respeito deve existir.
-Jamir? -E também que...
Não transforme a sua imaturidade
nessa coisa pequena de querer responsabilizar o outro
pelas suas falhas afetivas!
O que está acontecendo? Você está bem?
-Agora estou, Sérgio. -Mas o que houve?
-Por que você tá me ligando? -Essa é...
aquela última discussão que a gente tava tendo.
Era sobre isso aqui. É isso que eu tenho pra te dizer.
Mas que... como assim, que discussão, Jamir?
A gente terminou tem um tempão,
deve ter uns três anos que a gente não se fala.
Exatamente! E você sabe muito bem
que eu não sou de levar desaforo pra casa, Sérgio.
E digo mais, hein!
Digo... Só um minuto... Digo... Quer ver?
Agora que você vai ver. Espera aí que eu anotei isso em algum lugar...
Aqui ó!
Hoje... Hoje estou completamente apto pra dar apenas
o que você merece, Sérgio: a indiferença.
Ah não. Eu não acredito, Jamir. Espera aí. Eu não acredito.
Você tá me ligando depois desse tempo todo
-pra reviver uma discussão? É isso? -Não, eu não quero reviver nada!
Calma, Sérgio, que eu tenho isso anotado aqui!
Espera, que eu sabia que você ia falar coisa de reviver.
Espera, não é isso.
Espera... Ó, está aqui!
Eu não quero reviver nada! Eu liguei justamente pra...
O que é isso aqui? Pra encerrar!
Pra encerrar aquela conversa,
ou você acha que todo mundo é como você...
Ah, essa é a melhor parte.
Que age como um psicopata frio e calculista,
que na hora da discussão tem todas as respostas!
Eu não, eu sou um ser humano!
Então eu preciso do meu tempo pra assimilar, absorver
-e poder rebater. -Jamir, não estou entendendo nada,
o que você está falando não faz sentido. O que é isso?
Ah, agora vai me chamar de louco, agora eu sou doido!
Eu devo ser doido! Eu estou doido, eu estou doido, eu estou doido!
-Vai me chamar de doido? -Não vou te chamar de doido,
-não é isso. -Não, me chama.
Me chama de doido sim. Me chama, é até bom que daí eu uso aqui
o áudio que eu fiz com a minha analista aqui.
Espera um minuto. Calma que vou botar o "playzinho" dela.
Não sei se é prudente eu falar diretamente com ele...
Não, não, é... Perdão, perdão, perdão.
Está longo o áudio, é outro...
Você precisa parar de se colocar nesse lugar...
-Como dizia Lacan... -Lacan de cu é rola.
Espera aí! Calma, Sérgio, que eu vou achar o ponto certo...
Ah, é agora!
Com isso, concluímos então que ninguém dá o que não tem.
Toma, Sérgio!
Ai, que difícil, né, Sérgio, encarar certas verdades.
Que verdades, gente? Eu não sei nem que discussão é essa
que você está querendo desencavar aí, eu não sei...
Não seja por isso! Ô Sérgio, eu acabei de mandar
pro teu e-mail aí. Abre aí agora.
Está aqui. Mandei um arquivo todo transcrito pra você.
Já está aberto aqui. Já cheguei.
Me dá as deixas que eu botei tudo em azul as tuas falas.
Aí você fala e eu digo pra você o que eu teria dito na época
que você disse aquilo que você disse.
-Começa na página 1, vai. -Não precisa, Jamir. Não precisa.
Tá? Não precisa. Eu estou entendendo que isso aí
é uma coisa que você precisa fazer pra você se sentir melhor,
é um movimento que você precisa fazer...
Tá bom. Eu não vou me opor a isso não. Tá?
-Sério? -É. É sério.
Se você demorou esse tempo todo pra elaborar o que aconteceu, eu...
Só o que eu posso fazer é tentar te entender, é...
pedir desculpa. Mesmo atrasado.
Sei.
Então, você me desculpa?
Aí é foda, né, Sérgio? Você fica bancando o evoluído,
fica mandando o desconstruidão aí...
Aí fico eu que nem um sem noção afetado...
Mas, ó, não vai ficar assim não, Sérgio!
Você me dá meia hora. Me dá meu tempo
pra eu concatenar tudo aqui, que eu vou dizer pra você...
um monte de coisa que eu vou saber em meia hora.
Filha da puta...
Alô?
Como assim, estou sendo perdoado?
Quem está falando?
Jamir? Jamir da onde?
Meu Deus! Jamir! Quanto tempo!
Como é que você vai?
É... Só me lembra de uma coisa.
Eu pedi desculpas pelo quê?