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BBC News 2021 (Brasil), 3 efeitos no Brasil do descontrole da pandemia na Índia

3 efeitos no Brasil do descontrole da pandemia na Índia

A situação calamitosa da pandemia de covid-19 na Índia, com índices de contaminação

nunca vistos até agora no mundo, tem despertado uma grande mobilização por parte de líderes

internacionais.

Algumas cenas de desespero repetem o que a gente aqui no Brasil, infelizmente, tem vivido

na pele: Falta de leitos em hospitais, escassez de

oxigênio e de medicamentos, uma quantidade de doentes muito maior do que o sistema de

saúde é capaz de atender.

E muita gente não sabe, mas o que está acontecendo lá, do outro lado do mundo, também afeta

a gente aqui.

Eu sou Paula Adamo Idoeta, da BBC News Brasil aqui em São Paulo, e neste vídeo vou explicar

três impactos diretos que a situação lá na Índia já tem ou pode ter em breve no

Brasil.

Antes, é importante lembrar que a Índia tem uma população mais de seis vezes maior

do que a brasileira.

E está batendo sucessivos recordes mundiais de novos casos de covid-19, com uma média

que já passou dos 350 mil infectados a cada dia.

Essa dimensão gigantesca faz com que os efeitos da tragédia indiana tenham impactos que vão

muito além da sua fronteira, com efeitos para o mundo inteiro e particularmente para

o Brasil, ainda fragilizado pela segunda onda - que, é bom lembrar, ainda não terminou!

- e pelo baixo índice de vacinação até agora.

Agora, vamos direto ao ponto.

O primeiro impacto é que a crise lá acirra ainda mais a disputa por vacinas no mundo.

A Índia, como o Brasil, ainda vacina pouco em proporção ao tamanho de sua população,

apesar de ser um dos maiores centros mundiais de produção de imunizantes.

O colapso do sistema de saúde indiano fez com que aumentasse a pressão sobre o presidente

americano, Joe Biden, pela liberação do excedente de vacinas dos Estados Unidos, um

país que tem conseguido vacinar em índices bastante altos até agora.

Na última semana, o governo Biden anunciou que vai doar ao mundo 60 milhões de doses

da vacina Oxford/AstraZeneca nos próximos meses, depois que ela for produzida e passar

por inspeções de segurança.

Essa vacina ainda não tem autorização de uso nos Estados Unidos, e esse lote de imunizantes

vinha sendo cobiçado por muitos países – inclusive pelo Brasil.

Em março, o Itamaraty havia tentado adquirir essas doses.

Até o Senado brasileiro enviou um apelo à vice-presidente americana Kamala Harris para

que as vacinas fossem ofertadas ao Brasil.

Agora, com a demanda explodindo na Índia, não se sabe se o Brasil conseguirá abocanhar

alguma parcela desse lote.

O governo americano ainda não divulgou como vai ser a partilha dessas 60 milhões de doses,

mas fontes ouvidas pelas agências de notícias dizem que a Índia está batalhando para ficar

com a maior parte delas.

Essa demanda por vacinas tem outra frente importante.

A Fiocruz ainda aguarda um montante de 8 milhões de doses também da vacina AstraZeneca em

fabricação pelo Instituto Serum, lá na Índia.

As negociações em torno da entrega dessas doses estão sendo feitas, segundo a Fiocruz,

diretamente pelo Itamaraty.

O temor é de que a pressão interna e a necessidade de imunizar sua população mais rapidamente

façam com que a Índia retenha para si, pelo menos temporariamente, a produção do Instituto

Serum, algo que já aconteceu em março.

E não é só o Brasil que corre esse risco.

A Índia ajudaria a fornecer vacinas a vários países mais pobres, que agora também corre

risco de ver sua vacinação atrasada.

E não é só vacina que está escassa, não.

Vamos ao item 2, que é o aumento na demanda por equipamentos e medicamentos que já estão

escassos.

Oxigênio, respiradores, testes, equipamentos e medicamentos – tudo isso tem sido doado

para a Índia por diversos países do mundo, para tentar amenizar a crise por lá.

A pedido dos indianos, os Estados Unidos até suspenderam um veto que impedia que o país

exportasse, em tempos de crise, matérias-primas para a produção de vacinas e anunciasse

que vai enviar esses insumos para estimular a produção local indiana.

Mas a demanda da Índia é tão gigantesca que pode drenar recursos e medicamentos que

ainda estão escassos pelo mundo, dentro de uma cadeia de suprimentos que foi muito afetada

pela pandemia.

Basta lembrar as dificuldades que o Brasil enfrentou recentemente para obter no mercado

externo insumos para a produção do chamado “kit intubação”.

Isso forçou algumas equipes hospitalares a fechar leitos ou a intubar pacientes sem

poder sedá-los com medicamentos adequados - algo considerado desumano pelos próprios

médicos.

O uso desses insumos continua alto no Brasil, que ainda continua com índices altíssimos

de contaminação e mortes.

Eu conversei sobre isso com a Fátima Marinho, que foi da Secretaria de Vigilância em Saúde

do Ministério da Saúde entre 2005 e 2007 e hoje integra a consultoria de saúde Vital

Strategies.

E ela confirmou que, enquanto o Brasil mantiver o alto nível de ocupação hospitalar e de

leitos de UTI, vai continuar enfrentando dificuldade em estabilizar o estoque de alguns medicamentos.

A produção de muitos deles depende de insumos importados.

Por isso, Fátima Marinho sugere que o Brasil aproveite este pequeno alívio atual para

repor os estoques o máximo que conseguir e para se preparar para mais uma onda brutal

de covid-19.

Isso porque sim, infelizmente os epidemiologistas preveem que a doença vai voltar a ganhar

força aqui, principalmente se a gente não investir massivamente em testagem, isolamento

social e controle genômico do vírus.

E é disso que eu vou falar no terceiro e ultimo ponto deste vírus: a Índia sofre

com uma nova variante.

A gente viu esse filme triste por aqui: mesmo quando a população de Manaus já tinha um

alto índice de anticorpos contra o coronavírus por causa da primeira onda de covid-19, veio

a variante brasileira P1 e devastou novamente a cidade amazonense.

Agora, isso se repete na Índia, que lida tanto com a variante britânica quanto com

uma variante local, que também parece ser mais infecciosa e, portanto, mais perigosa.

As variantes surgem em comunidades onde o vírus consegue se propagar descontroladamente.

Ele vai infectando tanta gente com tanta rapidez que, nesse processo, tem a oportunidade de

produzir mutações aleatórias.

As mutações mais fortes vão se tornando dominantes, com consequências trágicas:

Primeiro, elas costumam ser mais infecciosas e podem também ser mais graves, fazendo com

que a saúde dos pacientes, até mesmo jovens, se deteriore mais rapidamente

Segundo, elas escapam da imunização por contaminação, ou seja, quem se infectou

antes por covid-19 pode voltar a adoecer E terceiro, elas podem tornar as vacinas atuais

menos eficientes contra a covid-19.

É justamente por isso que o cenário atual na Índia tanto preocupa o mundo inteiro:

com índices tão grandes de infecção como os que estão sendo vistos hoje, o país asiático

é um ambiente ideal para o vírus produzir muitas mutações aleatórias.

Em um planeta globalizado como o nosso, essas mutações podem se espalhar facilmente.

Não é à toa que os infectologistas dizem que não existe solução isolada para a pandemia:

ou o mundo inteiro luta contra a doença junto, ou basta uma variante surgida em um país,

por mais distante que ele seja, para ameaçar o planeta inteiro.

A Fátima Marinho, da Vital Strategies, aponta também que vai ser cada vez mais importante

rastrear a genética dos vírus que estão infectando as pessoas, inclusive aqui no Brasil.

Ou seja, não basta mais saber apenas se a pessoa testou positivo ou negativo para a

covid-19, mas analisar o genoma do vírus para identificar com rapidez eventuais novas

variantes que estejam surgindo por aí.

Por hoje é só, espero que as informações tenham sido úteis!

Siga acompanhando a nossa cobertura da pandemia no YouTube, nas redes sociais e no nosso site,

o bbcbrasil.com.

Até a próxima.

3 efeitos no Brasil do descontrole da pandemia na Índia 3 effects in Brazil of the uncontrolled pandemic in India

A situação calamitosa da pandemia de covid-19 na Índia, com índices de contaminação

nunca vistos até agora no mundo, tem despertado uma grande mobilização por parte de líderes

internacionais.

Algumas cenas de desespero repetem o que a gente aqui no Brasil, infelizmente, tem vivido

na pele: Falta de leitos em hospitais, escassez de

oxigênio e de medicamentos, uma quantidade de doentes muito maior do que o sistema de

saúde é capaz de atender.

E muita gente não sabe, mas o que está acontecendo lá, do outro lado do mundo, também afeta

a gente aqui.

Eu sou Paula Adamo Idoeta, da BBC News Brasil aqui em São Paulo, e neste vídeo vou explicar

três impactos diretos que a situação lá na Índia já tem ou pode ter em breve no

Brasil.

Antes, é importante lembrar que a Índia tem uma população mais de seis vezes maior

do que a brasileira.

E está batendo sucessivos recordes mundiais de novos casos de covid-19, com uma média

que já passou dos 350 mil infectados a cada dia.

Essa dimensão gigantesca faz com que os efeitos da tragédia indiana tenham impactos que vão

muito além da sua fronteira, com efeitos para o mundo inteiro e particularmente para

o Brasil, ainda fragilizado pela segunda onda - que, é bom lembrar, ainda não terminou!

- e pelo baixo índice de vacinação até agora.

Agora, vamos direto ao ponto.

O primeiro impacto é que a crise lá acirra ainda mais a disputa por vacinas no mundo.

A Índia, como o Brasil, ainda vacina pouco em proporção ao tamanho de sua população,

apesar de ser um dos maiores centros mundiais de produção de imunizantes.

O colapso do sistema de saúde indiano fez com que aumentasse a pressão sobre o presidente

americano, Joe Biden, pela liberação do excedente de vacinas dos Estados Unidos, um

país que tem conseguido vacinar em índices bastante altos até agora.

Na última semana, o governo Biden anunciou que vai doar ao mundo 60 milhões de doses

da vacina Oxford/AstraZeneca nos próximos meses, depois que ela for produzida e passar

por inspeções de segurança.

Essa vacina ainda não tem autorização de uso nos Estados Unidos, e esse lote de imunizantes

vinha sendo cobiçado por muitos países – inclusive pelo Brasil.

Em março, o Itamaraty havia tentado adquirir essas doses.

Até o Senado brasileiro enviou um apelo à vice-presidente americana Kamala Harris para

que as vacinas fossem ofertadas ao Brasil.

Agora, com a demanda explodindo na Índia, não se sabe se o Brasil conseguirá abocanhar

alguma parcela desse lote.

O governo americano ainda não divulgou como vai ser a partilha dessas 60 milhões de doses,

mas fontes ouvidas pelas agências de notícias dizem que a Índia está batalhando para ficar

com a maior parte delas.

Essa demanda por vacinas tem outra frente importante.

A Fiocruz ainda aguarda um montante de 8 milhões de doses também da vacina AstraZeneca em

fabricação pelo Instituto Serum, lá na Índia.

As negociações em torno da entrega dessas doses estão sendo feitas, segundo a Fiocruz,

diretamente pelo Itamaraty.

O temor é de que a pressão interna e a necessidade de imunizar sua população mais rapidamente

façam com que a Índia retenha para si, pelo menos temporariamente, a produção do Instituto

Serum, algo que já aconteceu em março.

E não é só o Brasil que corre esse risco.

A Índia ajudaria a fornecer vacinas a vários países mais pobres, que agora também corre

risco de ver sua vacinação atrasada.

E não é só vacina que está escassa, não.

Vamos ao item 2, que é o aumento na demanda por equipamentos e medicamentos que já estão

escassos.

Oxigênio, respiradores, testes, equipamentos e medicamentos – tudo isso tem sido doado

para a Índia por diversos países do mundo, para tentar amenizar a crise por lá.

A pedido dos indianos, os Estados Unidos até suspenderam um veto que impedia que o país

exportasse, em tempos de crise, matérias-primas para a produção de vacinas e anunciasse

que vai enviar esses insumos para estimular a produção local indiana.

Mas a demanda da Índia é tão gigantesca que pode drenar recursos e medicamentos que

ainda estão escassos pelo mundo, dentro de uma cadeia de suprimentos que foi muito afetada

pela pandemia.

Basta lembrar as dificuldades que o Brasil enfrentou recentemente para obter no mercado

externo insumos para a produção do chamado “kit intubação”.

Isso forçou algumas equipes hospitalares a fechar leitos ou a intubar pacientes sem

poder sedá-los com medicamentos adequados - algo considerado desumano pelos próprios

médicos.

O uso desses insumos continua alto no Brasil, que ainda continua com índices altíssimos

de contaminação e mortes.

Eu conversei sobre isso com a Fátima Marinho, que foi da Secretaria de Vigilância em Saúde

do Ministério da Saúde entre 2005 e 2007 e hoje integra a consultoria de saúde Vital

Strategies.

E ela confirmou que, enquanto o Brasil mantiver o alto nível de ocupação hospitalar e de

leitos de UTI, vai continuar enfrentando dificuldade em estabilizar o estoque de alguns medicamentos.

A produção de muitos deles depende de insumos importados.

Por isso, Fátima Marinho sugere que o Brasil aproveite este pequeno alívio atual para

repor os estoques o máximo que conseguir e para se preparar para mais uma onda brutal

de covid-19.

Isso porque sim, infelizmente os epidemiologistas preveem que a doença vai voltar a ganhar

força aqui, principalmente se a gente não investir massivamente em testagem, isolamento

social e controle genômico do vírus.

E é disso que eu vou falar no terceiro e ultimo ponto deste vírus: a Índia sofre

com uma nova variante.

A gente viu esse filme triste por aqui: mesmo quando a população de Manaus já tinha um

alto índice de anticorpos contra o coronavírus por causa da primeira onda de covid-19, veio

a variante brasileira P1 e devastou novamente a cidade amazonense.

Agora, isso se repete na Índia, que lida tanto com a variante britânica quanto com

uma variante local, que também parece ser mais infecciosa e, portanto, mais perigosa.

As variantes surgem em comunidades onde o vírus consegue se propagar descontroladamente.

Ele vai infectando tanta gente com tanta rapidez que, nesse processo, tem a oportunidade de

produzir mutações aleatórias.

As mutações mais fortes vão se tornando dominantes, com consequências trágicas:

Primeiro, elas costumam ser mais infecciosas e podem também ser mais graves, fazendo com

que a saúde dos pacientes, até mesmo jovens, se deteriore mais rapidamente

Segundo, elas escapam da imunização por contaminação, ou seja, quem se infectou

antes por covid-19 pode voltar a adoecer E terceiro, elas podem tornar as vacinas atuais

menos eficientes contra a covid-19.

É justamente por isso que o cenário atual na Índia tanto preocupa o mundo inteiro:

com índices tão grandes de infecção como os que estão sendo vistos hoje, o país asiático

é um ambiente ideal para o vírus produzir muitas mutações aleatórias.

Em um planeta globalizado como o nosso, essas mutações podem se espalhar facilmente.

Não é à toa que os infectologistas dizem que não existe solução isolada para a pandemia:

ou o mundo inteiro luta contra a doença junto, ou basta uma variante surgida em um país,

por mais distante que ele seja, para ameaçar o planeta inteiro.

A Fátima Marinho, da Vital Strategies, aponta também que vai ser cada vez mais importante

rastrear a genética dos vírus que estão infectando as pessoas, inclusive aqui no Brasil.

Ou seja, não basta mais saber apenas se a pessoa testou positivo ou negativo para a

covid-19, mas analisar o genoma do vírus para identificar com rapidez eventuais novas

variantes que estejam surgindo por aí.

Por hoje é só, espero que as informações tenham sido úteis!

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Até a próxima.